Resumo
O objetivo do presente artigo é apresentar a maneira peculiar como Roberto Schwarz incorporou e avançou certos trabalhos do pensamento social brasileiro, em especial os da chamada “sociologia paulista”, ao os articular com a teoria crítica de Adorno para levar a cabo uma interpretação da forma literária do primeiro romance de maturidade de Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas. A discussão gira em torno de como tal articulação entre história, teoria social e literatura resultou em uma independência intelectual tanto em sua incorporação do pensamento local, como na tradução e atualização de teorias estrangeiras a partir do contexto nacional, assim como gerou uma interpretação bastante singular da “formação” nacional – à luz do ponto de vista da periferia do capitalismo e em sentido “negativo”. A hipótese do trabalho é que tanto a interpretação do Brasil como a postura intelectual de Schwarz foram, em grande medida, inspiradas pela posição independente e cética de Machado em relação à postura dos escritores, à elite e aos rumos do país de sua época. Além disso, argumento que o trabalho de interpretação da obra e da posição político-intelectual de Machado de Assis realizado por Schwarz apresenta a possibilidade de se pensar o romancista como um dos primeiros grandes intérpretes do Brasil, já que o crítico inaugurou a compreensão da forma literária machadiana como um procedimento de crítica que fora gestado a partir dos impasses e das contradições ideológicas e políticas do Brasil do final do século XIX.
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