Resumo
A solidão da mulher negra tem suscitado vários debates nas redes sociais, no Brasil. Apesar de ser um tema novo para alguns, ele se trata de uma forma de racismo que se perpetua desde a escravidão, constituindo-se enquanto uma questão histórica ligada ao processo de hierarquização e marginalização sobre os corpos das mulheres negras brasileiras. Assim, a partir do aporte teórico-metodológico da Análise de Discurso (AD) fundada por Pêcheux, este trabalho visa analisar como a solidão da mulher negra é discursivizada nas mídias digitais. Busca ainda compreender como esse discurso é afetado pelas condições de produção/circulação dessas mídias; como a memória do discurso racista afeta o discurso sobre o corpo da mulher negra; como se dá o confronto discursivo nessa trama e como funciona a resistência em/na rede. O estudo contará ainda com contribuições das Ciências Sociais, que discutem racismo e machismo. Utilizamos o print screen (captura de tela) para coleta de materialidades postadas no Instagram e Youtube. Três Sequências Discursivas (SDs) constituem o corpus discursivo. Nos gestos de leitura, observamos o funcionamento de um jogo de forças e uma tensão discursiva entre a memória discursiva de hipersexualização e desumanização sobre esses corpos e os movimentos de contradiscursos e resistência ao discurso racista e machista na/em rede. Verificamos ainda que as mídias digitais podem se configurar como espaço para a circulação de sentidos silenciados ao longo dos anos.
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