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O Projeto Porto Maravilha e os 450 anos da cidade do Rio: sobre realces e silenciamentos 2 2 Editor responsável: André Luiz Paulilo <https://orcid.org/0000-0001-8112-8070> 3 3 Normalização, preparação e revisão textual: Vera Lúcia Fator Gouvêa Bonilha <verah.bonilha@gmail.com> 4 4 Apoio: CAPES-PROEX-Projeto 0446/2021.

Resumo

O artigo se interessa pela discussão de determinados usos políticos que a Administração de Eduardo Paes empreendeu em relação ao passado carioca durante o período de dois mandatos consecutivos em que esteve à frente da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro (2009-2016). Para tanto, ancorado na problematização dos diferentes lugares de memória e suas relações com aquilo que é fabricado e ensinado pelos historiadores em suas operações historiográficas, concentra as atenções no Projeto Porto Maravilha, que despontou dentro dos festejos dos 450 anos da cidade, comemorados em 2015. Tal efeméride concorreu tanto para a mobilização de esforços de apagamento de dimensões e obras públicas relacionadas ao período da ditadura militar quanto para a emergência de outras histórias para a cidade e sua gente.

Palavras-chave
História da Educação; Rio de Janeiro; Reformas Urbanas e Porto Maravilha

Abstract

This paper discusses certain political uses that the Administration of Eduardo Paes has undertaken concerning the Rio de Janeiro past during his two consecutive terms in charge of the city hall (2009-2016). To this end, anchored in the problematization of different places of memory and their relationship with what is made and taught by historians in their historiographic operations, it focuses on the Porto Maravilha Project that emerged within the celebrations of the city's 450th anniversary, celebrated in 2015. This event contributed both to erasing dimensions and public works related to the military dictatorship and the emergence of other (hi)stories for the city and its people.

Keywords
History of Education; Rio de Janeiro; Urban Reforms and Porto Maravilha

Introdução

Desde o início de 2020, os impactos oriundos da Covid-19, doença provocada pelo novo coronavírus, são notórios e estarrecedores num contexto mundial. Tanto assim que, por conta da velocidade do contágio e do aumento substancial do número de óbitos, em março daquele ano, a Organização Mundial de Saúde passou a definir o surto como pandemia. No Brasil, infelizmente, ações contraditórias, opressoras e equivocadas advindas, especialmente, de (des)orientações governamentais concorreram para que, até setembro de 2021, a marca de 595 mil mortes já tivesse sido ultrapassada. No entanto, muito mais do que números – é sempre imprescindível enfatizar – estamos lidando com sonhos, projetos, lares, anseios, famílias, enfim, histórias que foram (e permanecem sendo) destroçadas pela doença.

Esse quadro desolador vivenciado no País tem colaborado, também, para intensificar aquelas estratégias que, sob a lógica das ações de governo das populações, tencionam reforçar marcos, celebrar personagens, enfim, usar politicamente acontecimentos históricos. Por outras palavras, de modo cada vez mais constante, temos assistido aos esforços interessados em inventar tradições (Hobsbawm & Ranger, 1984Hobsbawm, E., & Ranger, T. (orgs.) (1984). A invenção das tradições. Paz e Terra.) sobre o passado nacional. Nessa linha, determinadas discursividades (Foucault, 2008Foucault, M. (2008). A arqueologia do saber. Forense Universitária.) vêm sendo acionadas por revisionistas que têm investido em distorções de acontecimentos históricos com o objetivo de (re)significá-los e/ou atenuá-los. Igualmente, negacionistas têm deliberadamente colocado sob suspeita a ocorrência de acontecimentos como a ditadura, a tortura, o holocausto, o nazismo, o fascismo, a escravidão, o aquecimento global, a degradação do meio ambiente, a contundência do surto pandêmico da Covid-19, dentre outros inúmeros exemplos. Tais distorções e reinterpretações do passado, sobretudo, se relacionam às disputas e às interações estabelecidas entre “o vivido e o aprendido, o vivido e o transmitido” (Pollak, 1989Pollak, M. (1989). Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, 2(3), 3-15., p. 9).

Dessa perspectiva, a problematização dos usos políticos que almejaram (e, em certo sentido, permanecem almejando) impingir diferentes discursividades aos acontecimentos históricos deve integrar a agenda daqueles que se interessam pela investigação das Histórias. Algo que diz respeito tanto às narrativas que já foram analisadas quanto aquelas que podem (ou, mais ainda, necessitam) ser escrutinadas. Afinal, os atos de celebrar e silenciar carregam consigo as disputas e os investimentos mobilizados a partir, e em função, das exigências sociais de cada período histórico.

Essa projeção de luzes para as disputas e para os investimentos referentes às produções de sentido para o passado colabora por reforçar a questão de que “não há memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar atas, porque essas operações não são naturais” (Nora, 1993Nora, P. (1993). Entre Memória e História: a problemática dos lugares. Proj. História 14, 7-28., p. 13). Nessa medida, convém insistir que serão as interpretações, as coleções documentais construídas, os recortes, as seleções, as celebrações, os silenciamentos etc. que propiciarão as condições para a produção dos acontecimentos e fabricação das Histórias (De Certeau, 1982De Certeau, M (1982). A escrita da história. Forense Universitária.; Foucault, 1988Foucault, M. (1988). Microfísica do poder. Graal., 2008Foucault, M. (2008). A arqueologia do saber. Forense Universitária.).

Problematizar a produção do conhecimento em História a partir, e em função, dessas ponderações significa, sobretudo, enfatizar as perspectivas teórico-metodológicas que anseiam colocar em realce as contingências do presente no trabalho de produção de narrativas sobre o passado. A esse respeito, vale a pena acompanhar as análises de Paul Veyne (2014)Veyne, P. (2014). Como se escreve a História; Foucault revoluciona a História. Editora da Universidade de Brasília.:

A história é uma narrativa de evento: todo o resto resulta disso. Já que é, de fato, uma narrativa, ela não faz reviver esses eventos, assim como tampouco o faz o romance; o vivido, tal como ressai das mãos do historiador, não é o dos atores; é uma narração, o que permite evitar alguns falsos problemas. Como o romance, a história seleciona, simplifica, organiza, faz com que um século caiba numa página.

(p. 18)

A rigor, a reflexão acerca dessas especificidades referentes às Histórias, às memórias e às costuras narrativas que são mobilizadas para a fabricação do passado (De Certeau, 1982De Certeau, M (1982). A escrita da história. Forense Universitária.) contribui para que possamos indiciar alguns dos usos políticos que já foram (e outros tantos que permanecem sendo) empreendidos por diferentes ações de governo das populações em variados momentos históricos. Desta feita, dentro dos recortes conferidos, nossas atenções se concentraram em algumas iniciativas que tencionaram celebrar a chegada dos 450 anos da cidade do Rio de Janeiro (em 2015) – com especial atenção para o denominado Projeto Porto Maravilha.

Para tanto, o texto foi dividido em quatro partes. Na primeira, abordamos o denominado período das “Reformas Urbanas” (1960-1975) e algumas de suas implicações políticas e sociais durante o período da ditadura militar. Na segunda, enfocamos o esforço de esquecimento almejado pela destruição do Elevado da Perimetral, obra fundamental para a celebração dos 450 anos da cidade. Na terceira, concentramos as atenções no Projeto Porto Maravilha, relacionando-o com outras iniciativas que despontaram naquele presente. Na quarta, elaborada à guisa de considerações finais, o Museu de Arte do Rio (MAR) e o Programa de Valorização da Memória e da Cultura Popular Carioca (Pró-Carioca) são explorados a partir de suas tentativas de realçar algumas histórias para a cidade e sua gente.

As reformas urbanas daquela que deixava de ser a capital do Brasil

Para que se torne possível dimensionar aspectos do Projeto Porto Maravilha, investimento empreendido pela gestão do prefeito Eduardo Paes (2009-2016), é necessário considerar que suas interferências na paisagem urbana da cidade do Rio ocorreram em lugares de memória em disputa com um período bastante difícil de nossa história: a chamada ditadura militar (1964-1985). A esse respeito, como nos recorda Jacques Le Goff (1996, p. 426)Le Goff, J. (1996). História e memória. (4 ed.). Ed. da Unicamp., os esforços para que se convertessem (e prossigam se convertendo) em “senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas. Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos”. Sensibilizados, também, por essas ponderações, nos questionamos: o que se pretendeu esquecer para se efetivar o Projeto Porto Maravilha?

Para abordar essa questão, de largada, somos obrigados a pensar no que foi destruído. A esse respeito, convém salientar que a lógica reformadora da administração Eduardo Paes direcionou suas atenções, justamente, para muitos lugares de memória que haviam sido erigidos durante o período ditatorial. Assim, ponderando que tanto as histórias como as memórias da ditadura são ainda assuntos em constantes disputas em nossa sociedade, todo e qualquer esforço engendrado com o sentido de produzir esquecimentos podem concorrer para a emergência de representações sociais perigosas. Dentre essas, as mais recorrentes são aquelas que enfatizam a fantasiosa ideia de que o período da ditadura era melhor do que o período democrático5 5 Segundo o ex-presidente Bolsonaro, o golpe de 1964, que ele chama de movimento, ocorreu em defesa da democracia. Em 2021, ele ordenou que os Comandos Militares comemorassem o aniversário da Revolução (movimento). Em nota publicada na Ordem do Dia, assinada pelos três comandos das Forças Armadas o, então, Ministro da Defesa Walter Braga Neto (que substituiu naquele mesmo dia o Ministro Fernando Azevedo e Silva) ressaltou, na frase de abertura do documento, que “o Movimento de 1964 é um marco para a democracia brasileira. O Brasil reagiu com determinação às ameaças que se formavam àquela época”. Tal acontecimento explicita a tese defendida pelo ex-presidente de que o golpe foi feito para evitar uma revolução comunista no Brasil, portanto, foi feito em nome da democracia. Tais informações conflituosas são pistas para uma compreensão de que o projeto de nação defendido pelo atual governo pretende rever e negar a história do Brasil, inventando novas tradições. A esse respeito, ver: <https://abn.com.br/forcas-armadas-divulgam-ordem-do-dia-alusiva-ao-31-de-marco-de-1964/>. <https://veja.abril.com.br/politica/bolsonaro-quer-quarteis-comemorando-golpe-de-64-generais-sugerem-cautela/>. .

Essa fantasiosa ideia – que, infelizmente, ainda conhece seus adeptos revisionistas e negacionistas –, no caso do Rio de Janeiro, se encontra bastante calcada em determinadas discursividades que foram enfatizadas sobre as denominadas Reformas Urbanas que emergiram de 1960 a 1975. Foi nesse período que a transferência da capital do Brasil para Brasília, em abril de 1960, fez com que o antigo Distrito Federal assumisse a condição de estado da Federação, com o nome de Guanabara, passando, consequentemente, a ser administrado por governadores.

A condição de cidade-estado perdurou até março de 1975, quando foi implantada a fusão entre os estados do Rio de Janeiro e o da Guanabara, enquanto a cidade do Rio, como capital do novo estado, ganhou status de município, voltando a ser administrada por prefeitos. Entre 1960 e 1975, cinco governadores administraram a Guanabara: José Sette Câmara Filho, em 1960 (até a eleição do primeiro ocupante do cargo), Carlos Lacerda (1960-1965), Rafael de Almeida Magalhães (1965), Francisco Negrão de Lima (1965-1970) e Antônio Chagas Freitas (1970-1975)6 6 Dentre as inúmeras pesquisas que analisaram a construção de Brasília e os rebatimentos políticos, econômicos, sociais e culturais para o Rio de Janeiro, conferir: Abreu (2006), Almino (2007) e Freitag (2003). .

O primeiro governador da Guanabara, após eleições diretas, foi o jornalista Carlos Frederico Werneck de Lacerda que era filiado à União Democrática Nacional (UDN) e tomou posse em dezembro de 1960. De perfil conservador, foi aliado dos militares que articularam o golpe de 1964 e derrubaram João Goulart do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) da Presidência. Conhecido por ser um anticomunista e inimigo político de Getúlio Vargas, fatores que o levaram a angariar desafetos, assim como admiradores, o polêmico Lacerda foi um daqueles administradores que recebeu a alcunha de realizador da cidade do Rio de Janeiro (Motta, 2000aMotta, M. S. da (2000a). Saudades da Guanabara: o campo político da cidade do Rio de Janeiro (1960-75). FGV., 2005Motta, M. S. da. (2005). Carlos Lacerda: de demolidor de presidentes a construtor de estado. Nossa História, 19, 72-25.).

Para que se tenha uma ideia, durante a sua gestão, a cidade passou por transformações urbanas incisivas: alargamento de ruas, inauguração de viadutos, construção da segunda adutora do rio Guandu e a abertura dos túneis Santa Bárbara e Rebouças, este último chamado de “a obra do século”. Lacerda foi responsável, ainda, pela construção do Parque do Flamengo, de escolas e avenidas, entre elas a Avenida das Américas, na Barra da Tijuca. Finalmente, financiou o Plano Doxiadis, que previa a construção das linhas Amarela e Vermelha (Motta, 2000aMotta, M. S. da (2000a). Saudades da Guanabara: o campo político da cidade do Rio de Janeiro (1960-75). FGV., 2005Motta, M. S. da. (2005). Carlos Lacerda: de demolidor de presidentes a construtor de estado. Nossa História, 19, 72-25.; Rezende, 2014Rezende, V. L. F. M. (2014). O planejamento de cidades nos anos 60: uma reflexão a partir do Plano Doxiadis para o Estado da Guanabara. In Anais do III Enanparq: arquitetura, cidade e projeto: uma construção coletiva. São Paulo.).

O governo Lacerda foi marcado, também, pela política de remoção de comunidades no Rio de Janeiro, o que foi alvo de críticas por parte da população e dos especialistas. Aproximadamente 30 favelas foram erradicadas e centenas de famílias realocadas compulsoriamente para os primeiros conjuntos habitacionais construídos na cidade: Vila Kennedy, Vila Aliança e Vila Esperança7 7 Para maiores esclarecimentos acerca das realizações urbanísticas da Lacerda, conferir os trabalhos de Perez (2007), Gasparini (2004) e Leal (1997). . As remoções eram realizadas a despeito da aceitação dos moradores, uma vez que os conjuntos não contavam com infraestrutura adequada8 8 Sobre a remoção das comunidades no Rio de Janeiro, conferir: Abreu (2006), Brum (2012) e Cardoso (2009, 2010). . Nos governos seguintes, novos conjuntos habitacionais foram criados e mais famílias removidas, porém as favelas cariocas continuaram a crescer (Abreu, 2006Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP.).

Mesmo após o golpe de 1964, o governo militar manteve, em outubro de 1965, novas eleições diretas para o governo da Guanabara. Negrão de Lima9 9 Para maiores informações, conferir: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/biografias/negrao_de_lima>. , candidato de oposição a Lacerda, foi quem levou a melhor. Ex-ministro de Juscelino Kubitschek (Relações Exteriores) e de Getúlio Vargas no período democrático (Justiça), foi eleito pela coligação formada pelo Partido Social Democrático (PSD) e pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o mesmo de João Goulart, presidente da República deposto (Araújo, 1996Araújo, M. C. S. (1996). Sindicatos, carisma e poder: o PTB de 1945-65. Editora da Fundação Getúlio Vargas.; Bandeira, 1979Bandeira, L. A. M. (1979). Brizola e o trabalhismo. Civilização Brasileira.).

Francisco Negrão de Lima tomou posse em 5 de dezembro de 1965, prometendo paz e trabalho. Seu mandato, que durou até março de 1970, também deixou alguns marcos urbanístico para a cidade, como a construção do Túnel Dois Irmãos, o alargamento da Praia de Copacabana, a recuperação da Praia de Botafogo e da Lagoa Rodrigo de Freitas e a inauguração de inúmeras escolas. Promoveu, ainda, o lançamento do Plano Lúcio Costa, iniciando a expansão do Rio rumo à Barra da Tijuca (Abreu, 2006Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP.; Cardoso, 2010Cardoso, E. D. (2010). Estrutura urbana e representações: a invenção da Zona Sul e a construção de um novo processo de segregação espacial no Rio de Janeiro nas primeiras décadas do século XX. GeoTextos, 6(1), 73-88.). Apesar de ter governado num dos períodos de maior cerceamento dos direitos políticos na História do país e de ter enfrentado forte oposição, ele conseguiu terminar o seu mandato (Motta, 2000aMotta, M. S. da (2000a). Saudades da Guanabara: o campo político da cidade do Rio de Janeiro (1960-75). FGV.).

Antônio de Pádua Chagas Freitas10 10 Para maiores informações, conferir: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/antonio-de-padua-chagas-freitas>.. tomou posse em 15 de março de 1970, prometendo resolver problemas de saúde e educação na cidade-estado. Sua forma particular de usar a máquina pública com objetivos eleitorais motivou a consagração do termo “chaguismo” na política fluminense (Motta, 2000bMotta, M. S. da (2000b). Mania de Estado: o chaguismo e a estadualização da Guanabara. História Oral, 3, 91-108.; Trindade, 2000Trindade, A. de A. (2000). O estilo político da Bica D'água: o chaguismo na Guanabara 1969-1974. Texto Cpdoc, 37.). Embora filiado ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido que se opunha à Aliança Renovadora Nacional (Arena), legenda oficial do regime militar, Chagas era acusado por seus adversários de ser uma espécie de “linha auxiliar” da ditadura na política regional. Esses adversários, chamados de “autênticos” do MDB e muitos reunidos no grupo ligado ao ex-governador Amaral Peixoto, opunham-se ao chaguismo11 11 De acordo com as reflexões de Lia Faria (2011), o chaguismo, sobretudo, se manifestava em práticas clientelistas com a utilização da denominada “máquina política” para fazer emergir expedientes antidemocráticos. , considerando suas políticas como clientelistas, consagradas na oferta de “bica d’água”12 12 Segundo Trindade (2000), o uso da expressão “bica d’água” refere-se à forma clientelista e regionalista com que Chagas Freitas governava o estado. Como o problema de abastecimento d’água era muito grave, o governador fazia alianças com políticos locais e criava um estilo de fazer política preocupado, sobretudo, com a composição dos interesses locais e com o atendimento das demandas da população (oferta d’água), associado ao investimento feito nas eleições, através da valorização do voto. http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/antonio-de-padua-chagas-freitas>. à população mais pobre (Motta, 2000bMotta, M. S. da (2000b). Mania de Estado: o chaguismo e a estadualização da Guanabara. História Oral, 3, 91-108.; Trindade, 2000Trindade, A. de A. (2000). O estilo político da Bica D'água: o chaguismo na Guanabara 1969-1974. Texto Cpdoc, 37.).

Entre as principais realizações de Chagas Freitas estão a reurbanização da Lapa, a recuperação e a ampliação do grande complexo do Guandu, o emissário submarino de Ipanema, a construção do viaduto da Mangueira e do Túnel Noel Rosa. Também fazem parte das suas obras a ampliação da rede distribuidora de gás e o funcionamento da Companhia Siderúrgica da Guanabara (Cosigua). Além disso, urbanizou a Ilha do Fundão, permitindo a inauguração da Cidade Universitária da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Abreu, 2006Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP.; Brum, 2012Brum, M. S. I. (2012). Cidade Alta: história, memorias e estigma de favela num conjunto habitacional do Rio de Janeiro. Ponteio.).

A gestão de Chagas Freitas foi alvo de polêmicas, entre elas o aumento do gabarito de diversos bairros, e de críticas, como a não execução de muitos projetos que ficaram só no papel. Seu mandato teve fim exatamente quatro anos depois de sua posse, em 15 de março de 1975, com a fusão da Guanabara com o Rio de Janeiro num único estado o que, para muitos especialistas, consistiu numa manobra política da ditadura para neutralizar o crescimento do MDB na Guanabara, já que o interior do estado do Rio seria dominado pela Arena (Motta, 2000aMotta, M. S. da (2000a). Saudades da Guanabara: o campo político da cidade do Rio de Janeiro (1960-75). FGV., 2000bMotta, M. S. da (2000b). Mania de Estado: o chaguismo e a estadualização da Guanabara. História Oral, 3, 91-108.).

A política local, em especial no Distrito Federal, depois Guanabara e Rio de Janeiro, foi afetada pelo golpe de forma muito difusa. Ou seja, para uma governabilidade dos militares, foi permitida uma organização política alicerçada em conchavos que criou uma máquina administrativa baseada em tráfico de influências. Tal fato estimulou a formação de uma rede de corrupção que marcou (e permanece marcando) o Rio de Janeiro. Motta (2000a)Motta, M. S. da (2000a). Saudades da Guanabara: o campo político da cidade do Rio de Janeiro (1960-75). FGV. defende a tese de que o clientelismo é um dos pilares da política fluminense, sendo, portanto, responsável por transformar a burocracia administrativa do Rio, e inclusive a do Brasil, em um aparelho de corrupção.

O golpe de 1964 colocou no poder um grupo composto por militares e empresários que estimulavam tal estrutura administrativa. Segundo Filgueiras e Aranha (2011)Filgueiras, F., & Aranha, A. L. M. (2011). Controle da corrupção e burocracia da linha de frente: regras, discricionariedade e reformas no Brasil. DADOS – Revista de Ciências Sociais, 54(2), 349-387., a ditadura reforçou os aparelhos locais de corrupção como a forma de garantir estabilidade política. Entretanto, como identificamos anteriormente, o Rio de Janeiro ganhou um destaque especial. A política da “bica d`água”, ou seja, o clientelismo do estado construiu um perfil de administrador local que se assume e se mantém no cargo com o compromisso de reproduzir tais práticas políticas.

Nesse contexto, as obras públicas – com especial atenção para as reformas urbanas –, são fundamentais para atender interesses específicos de grupos políticos locais. Uma rede de corrupção se forma para extorquir dinheiro público (Filgueiras & Aranha, 2011Filgueiras, F., & Aranha, A. L. M. (2011). Controle da corrupção e burocracia da linha de frente: regras, discricionariedade e reformas no Brasil. DADOS – Revista de Ciências Sociais, 54(2), 349-387.). A esse respeito, não parece ser nada casual que cinco ex-governadores do Rio de Janeiro e um ex-prefeito tenham sido presos: Wellington Moreira Franco (governador de 1987 a 1991); Anthony Garotinho (governador de 1999 a 2002); Rosinha Garotinho (governadora de 2003 a 2007); Sérgio Cabral (governador de 2007 a 2014), Luiz Fernando Pezão (governador de 2014 a 2018) e Marcelo Crivella (prefeito de 2017 a 2020)13 13 O governador Wilson Witzel – eleito para exercer o mandato de 2019 a 2023 – sofreu um processo de impeachment, que culminou em sua cassação em abril de 2021. . Essa enumeração é sugestiva para se pensar como a revitalização da região central da cidade e, em especial, o Projeto Porto Maravilha estiveram em meio a esse conjunto de disputas, tensões, acusações de desvios financeiros que marcaram os momentos de sua implementação.

E houve mais. Para a efetivação desse Projeto, eram necessárias mudanças e reconstruções de lugares de memória na cidade do Rio. Obras públicas recentes de grande porte, a maioria inaugurada durante o período ditatorial, seriam destruídas, apagando mais ainda a memória dos brasileiros e dos cariocas em relação ao período ditatorial, reforçando o discurso conservador em vigor, hoje, nos brasileiros de que a ditadura foi um período “bom” e de “restauração” da democracia. Com efeito, é possível se entender por que o ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, é um político que fez sua carreira no Rio de Janeiro.

Para compreender melhor esse processo de apagamento das Reformas Urbanas iniciadas e concluídas na ditadura (1960-1975), cabe atentar para aquela obra que atravessou todo este longo período: a construção do Elevado da Perimetral. Algumas das particularidades que estiveram envolvidas no projeto e nas fases de sua inauguração, bem como na sua posterior demolição, serão exploradas no próximo tópico.

O Elevado da Perimetral: da construção à demolição

A construção do Elevado da Perimetral14 14 Para maiores informações, conferir: <https://diariodorio.com/historia-do-elevado-da-perimetral/>. , uma via que facilitaria o acesso ao Aeroporto internacional do Galeão para quem viesse da zona sul, era uma obra que dava sequência aos parques do Flamengo (Aterro do Flamengo). Caracterizava-se, também, como um trajeto suplementar sobre a Avenida Rodrigues Alves, que ligava os principais entroncamentos rodoviários da cidade do Rio (Oliveira, 2006Oliveira, A. R. de. (2006). Parque do Flamengo: instrumento de planificação e resistência. Arquitextos, 79(5), 1-7.).

O elevado foi construído em etapas a partir dos anos de 1950, tendo sido inaugurado um trecho de cada vez. O primeiro, inaugurado em 1960, foi o que ligava o Aeroporto Santos Dumont e a Igreja de Nossa Senhora da Candelária. Situava-se acima da Avenida Alfred Agache e do antigo Túnel Engenheiro Carlos Marques Pamplona na Praça XV. Segundo Oliveira (2006)Oliveira, A. R. de. (2006). Parque do Flamengo: instrumento de planificação e resistência. Arquitextos, 79(5), 1-7., o trecho seguinte teve obras iniciadas em 1968, levando dez anos para serem finalizadas. Finalmente, o pedaço inaugurado em 1978 compreendia o entorno da Zona Portuária, e na sua maior parte se localizava acima da Avenida Rodrigues Alves.

Dessa forma, o Elevado dava acesso à zona norte, interligando 70% do trânsito que partia da zona sul em direção à Ponte Rio-Niterói, à Linha Vermelha e à Avenida Brasil e seguia sobre a Avenida Rodrigues Alves até a região do Aeroporto Santos Dumont, onde se conectava com a Avenida Infante Dom Henrique no Aterro do Flamengo, ligando-se diretamente à Avenida Atlântica e outras vias marginais à orla na zona sul (Abreu, 2006Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP.). Cortava os bairros do Caju, parte de São Cristóvão, Santo Cristo, Gamboa e Saúde e contava com o tráfego de mais setenta mil veículos nos dias úteis15 15 A esse respeito, ver: <https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/02/elevado-da-perimetral-no-rio-e-fechado-definitivamente-neste-sabado.htm>. .

O Elevado costumava ser criticado por ter mudado consideravelmente a estética do Cais da Gamboa e por obstaculizar a vista: tanto do mar, para quem estava na cidade, quanto do traçado arquitetônico, para quem estava nos navios e demais embarcações. Na área sobre a Avenida Rodrigues Alves, havia também a queixa de que deixava a avenida mais ameaçadora, reduzindo a iluminação e tornando o lugar ermo, propício para assaltos. Além da questão estética, a Perimetral ainda desvalorizou as casas localizadas no entorno da avenida, dando um aspecto sombrio ao lugar16 16 Para entender os impactos das reformas urbanas vinculadas ao parque do Flamengo e suas consequências para a cidade, conferir: Oliveira (2006), Abreu (2006), Perez (2007) e Leal (1997). . Dessa forma, sob a lógica das ações de governo, o Projeto Porto Maravilha passou também a ser divulgado como uma “solução” para esses “problemas”.

Portanto, para que esse Projeto avançasse, era necessário derrubar o Elevado da Perimetral que, dentro das disputas e dos investimentos referentes às produções de sentido para o passado da cidade, chegou mesmo a ser definido por Eduardo Paes como um “Muro de Berlim”17 17 Segundo Eduardo Paes, em publicação no jornal O Dia (5 de dezembro de 2014), a Perimetral dividia a cidade como um “Muro de Berlim”. <https://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-12-05/eduardo-paes-compara-derrubada-da-perimetral-a-queda-do-muro-de-berlim.html>. . No entanto, pelo menos, duas grandes questões se constituíam como entraves para a execução de tal empreitada. A primeira se referia ao ponto de que a obra alteraria o trânsito de toda a cidade, por isso ela foi destruída assim como fora construída, em etapas. A segunda questão concernia às dificuldades relacionadas ao destino que seria dado às vigas de aço que davam sustentação ao Elevado. Decidiram colocar em um depósito da prefeitura. Todavia, devido à qualidade do material, foram roubadas em 201318 18 Ao todo, foram roubadas seis vigas: cinco tinham 40 m de comprimento por 6 m de largura e outra, 25 m por 6 m de espessura. O valor estimado das vigas, em 2013, era de R$ 100 mil. <https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/10/1354722-policia-diz-que-roubo-vigas-foi-bem-planejado-e-durou-uma-semana.shtml>. .

A destruição do Elevado da Perimetral se tornou fundamental para a criação de novos e importantes lugares de memória interessados tanto em silenciar quanto em fazer emergir outros sentidos para as relações estabelecidas entre o passado e o presente da cidade: o MAR (2013), o Museu do Amanhã (2015), o AquaRio (2016) e a roda gigante Rio Yup Star (2019). Tal destruição também cumpriu um papel muito importante que o Prefeito Eduardo Paes soube usar muito bem. Ele se colocou no panteão dos prefeitos que mudaram a fisionomia da cidade, conferindo-lhe um ar de “modernidade vintage”, como lócus de memória de um outro Rio de Janeiro glamoroso e de sucesso que supostamente existiu em um passado distante.

Por fim, tal procedimento do, então, prefeito possibilitou a construção de novos lugares de memória, como já foi pontuado. Tais ações políticas consubstanciaram ampla visibilidade para Eduardo Paes, tanto assim que quatro anos após findado o seu segundo mandato (2013-2016), ele retornou eleito em 2020 para a prefeitura da cidade do Rio, laureado pelo discurso da competência.

O Projeto Porto Maravilha: as remodelações urbanas como espetáculos cotidianos

O Projeto Porto Maravilha, uma iniciativa da prefeitura do Rio que guardava conexões com os preparativos para a celebração dos 450 anos da cidade, teve como finalidade, conforme disposto na Lei Complementar n.º 102, de 23 de novembro de 200919 19 O marco legal para requalificar a Região Portuária se deu com a criação da Operação Urbana Consorciada em dezembro de 2009, a partir da aprovação das Leis Municipais Complementares 101 e 102. A legislação criou o Porto Maravilha, fixou regras para o investimento em infraestrutura da área com recursos da venda dos Certificados de Potencial Adicional de Construção (CEPACS) e instituiu a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP) para implantar o projeto. Dois acontecimentos contribuíram, decisivamente, para implementar essa iniciativa: a seleção do Brasil para a realização da Copa do Mundo de Futebol de 2014 e a escolha da cidade para sediar a Olimpíada de 2016. As expectativas despertadas para concretizar esses eventos concorreram para a formação de uma atmosfera propícia em relação a investimentos e alianças entre as esferas do governo municipal, estadual e federal, com objetivo de arrecadar verba junto à iniciativa privada , recuperar a infraestrutura urbana, dos transportes, do meio ambiente e dos patrimônios histórico e cultural da região portuária. Seu raio de atuação compreendia uma área de, aproximadamente, cinco milhões de metros quadrados, abarcando os bairros do Santo Cristo, Gamboa, Saúde e trechos do Centro, Caju, Cidade Nova e São Cristóvão.

Dentre as diferentes obras20 20 À guisa de ilustração, ao lado daquelas registradas anteriormente, convém destacar a construção do Túnel Rio 450, a inauguração do Túnel Prefeito Marcello Allencar e a implementação das linhas dos Veículos Leves sobre Trilhos. que integraram este empreendimento optamos neste estudo por incidir o foco na demolição do Elevado da Perimetral (com seus 4790 metros de extensão, como foi abordado anteriormente), na construção do Museu de Arte do Rio (MAR) e na instituição do Programa de Valorização da Memória e da Cultura Popular Carioca (Pró-Carioca) – estas duas últimas iniciativas serão exploradas mais adiante.

Pelos contundentes impactos promovidos no cotidiano citadino, o desenvolvimento do Projeto Porto Maravilha concorreu por trazer à tona as reflexões referentes às diferentes reformas urbanas e seus rebatimentos nos espaços e nos tempos sociais. No entanto, uma constante nessas reflexões foi, justamente, a pouca atenção despendida para a historicidade característica desses diversos planos reformistas que foram implementados na cidade.

Exemplo desse descaso em relação à historicidade dos acontecimentos pode ser indiciado nas aproximações que, sob a lógica das ações de governo, tentaram ser concretizadas da Administração de Francisco Pereira Passos (1902-1906) – o Haussmann Tropical21 21 Essa aproximação entre o Barão Georges Eugène Haussmann e o Pereira Passos já é bastante divulgada. Contudo, duas outras dimensões envolvidas neste cognome – “Haussmann Tropical” – são menos conhecidas: 1) Pereira Passos acompanhou pessoalmente, como funcionário da embaixada brasileira em Paris, de 1857 a 1860, a remodelação da capital francesa. Durante 17 anos (1853-1870), Haussmann foi o responsável principal pelo planejamento da cidade; 2) Pereira Passos, de 1880 a 1881, frequentou cursos na Sorbonne e no Collège de France (Azevedo, 2003; Benchimol, 1992; Pinheiro & Fialho Júnior, 2006). – com a de Eduardo Paes (2009-2016). Algo que, inclusive, chegou ao ponto de Eduardo Paes cogitar se fantasiar de Pereira Passos para o cerimonial de inauguração da primeira fase das obras da Zona Portuária, em 201222 22 <https://oglobo.globo.com/rio/em-campanha-paes-tenta-vincular-sua-imagem-as-transformacoes-feitas-por-pereira-passos-5433676>. .

Em meio às obras públicas que, cotidianamente, passaram a invadir os espaços e tempos citadinos, as ações de governo destacavam dia sim, outro também, a revitalização e/ou o aformoseamento urbano que seriam atingidos brevemente. Assim, costurava-se no período um exercício de convencimento e legitimação social para tais empreitadas.

Para que esse convencimento e legitimação fossem alcançados, em termos estratégicos, o Projeto Porto Maravilha efetivou algumas iniciativas de socialização, sensibilização e difusão das ações que vinham sendo empreendidas. É possível indiciar algumas dessas ações, por exemplo, naquilo que foi colocado em circulação pela Revista Maravilha23 23 Esse periódico foi lançado em março de 2010 e contou com 22 edições, sendo a última de dezembro de 2016. Como o próprio nome sugere, tratava-se de uma iniciativa editorial voltada, sobretudo, para a divulgação das benesses e maravilhas que seriam alcançadas a partir, e em função, das reformas empreendidas. ou, ainda, na estrutura de 588 m², denominada Meu Porto Maravilha24 24 Foi inaugurada em julho de 2012 e funcionou até o final 2015. Tratava-se de um espaço de exposições que tencionava familiarizar a população com as intervenções urbanas, advindas do Projeto Porto Maravilha, por meio de mapas, infográficos, fotos e vídeos das obras e perspectivas (Carvalho, 2018). , que foi montada na Avenida Barão de Tefé.

A conversão das remodelações urbanas em espetáculos cotidianos: esta foi a ênfase orquestrada pelo Projeto Porto Maravilha. Sobrepairava a essa conversão a preocupação de que a população atribuísse às transformações ocorridas uma conotação positiva. Fosse na demolição do Elevado da Perimetral, fosse na inauguração de diferentes equipamentos culturais (dentre estes, o MAR), fosse na revitalização das áreas alardeadas como “degradadas”, ou fosse, ainda, por meio daquilo que era colocado em circulação pela Revista Maravilha ou sentido/visualizado no Meu Porto Maravilha, os cariocas deveriam perceber o futuro como uma dimensão do presente.

Nesse quadro, com a implementação do Projeto Porto Maravilha, entrou em cena também um esforço em frisar algumas narrativas – silenciando, ou mesmo demolindo outras tantas – sobre a cidade e sua gente. Por outras palavras, sob a lógica de seus idealizadores, a aposta era de que os próprios espaços criados, os equipamentos culturais inaugurados e as obras públicas implantadas se constituíssem como símbolos de um novo tempo que deveria ser apreendido pela população. A esse respeito, as projeções direcionados para o MAR e para o Pró-Carioca foram bastante emblemáticas.

À guisa de considerações finais: algumas palavras sobre o MAR e o Pró-Carioca

O Museu de Arte do Rio (MAR) foi inaugurado no dia 1.º de março de 2013, na ocasião do aniversário de 448 anos, mas como parte dos comemorativos dos 450 anos da cidade do Rio. Sob a lógica organizacional prestigiada, a arte, a educação e as histórias deveriam se encontrar intrinsecamente articuladas. Dimensões que podem ser percebidas, inclusive, no projeto arquitetônico: ao unir dois prédios (o Museu e a Escola do Olhar), a circulação só poderia, em termos estratégicos, ser iniciada pela escola num sentido de que, para se chegar à arte, se tornava imprescindível transitar pela educação e pelas histórias (Melo, 2016Melo, J. (2016). Escola do Olhar: práticas educativas do Museu de Arte do Rio 2013-2015. Instituto Odeon.). A separação espacial entre o Pavilhão de Exposições e a Escola do Olhar alude, igualmente, para as concepções de um museu-escola ou uma escola que teria um museu ou, ainda, um museu que teria uma escola (Carvalho, 2018Carvalho, M. R. B. de. (2018). O MAR, a Cidade e as Histórias: sobre algumas das invenções do setor educativo. [Monografia de Graduação]. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.). Essas articulações indiciam aspectos relacionados às dimensões pedagógicas que tanto estiveram envolvidas na orquestração dos espaços do MAR quanto permanecem presentes nas aprendizagens que, estrategicamente, devem caracterizar os tempos de visitação.

Sobre essa articulação almejada entre a arte, a educação e as histórias, é necessário colocar em relevo, ainda, que o complexo arquitetônico do MAR entrelaça duas edificações. O museu ocupa o Palacete Dom João VI, construído em estilo eclético, em 1916, sendo o lugar onde funcionava a Inspetoria de Portos, Rios e Canais do Rio. Já o prédio onde se localiza a Escola do Olhar foi erigido na década de 1940 e abrigou o Terminal Rodoviário Mariano Procópio e o Hospital da Polícia Civil (que esteve em funcionamento até pouco antes do início das obras do projeto de intervenção urbana, quando o estado o entregou para o município do Rio para a construção do MAR).

De partida, cumpre registrar que o MAR foi idealizado, construído e inaugurado por meio de uma parceria entre a prefeitura e a Fundação Roberto Marinho, ficando a Organização Social Instituto Odeon (OSIO)25 25 O Instituto Odeon é uma associação privada de caráter cultural, sem fins lucrativos, que tem a missão de promover a gestão e a produção cultural e artística de excelência, em diálogo com a educação, agregando valor público para a sociedade. O Instituto foi formado a partir de uma ampliação da Odeon Companhia Teatral, organização criada em 1998. Tendo sido qualificado como Organização Social (OS) no Rio de Janeiro, o Instituto Odeon tornou-se, em 2012, parceiro da prefeitura na gestão do Museu de Arte do Rio – MAR. <http://institutoodeon.org.br/conheca-o-instituto/>. responsável pela gestão deste equipamento cultural. O contrato de gestão foi assinado em abril de 2012, e teve a validade estendida até 2017, quando foi renovado. Essa parceria, firmada entre a Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro e a OSIO, pressupõe o cumprimento de algumas metas operacionais e financeiras previamente definidas, ficando a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro responsável pelos repasses orçamentários (Carvalho, 2018Carvalho, M. R. B. de. (2018). O MAR, a Cidade e as Histórias: sobre algumas das invenções do setor educativo. [Monografia de Graduação]. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.).

No que diz respeito aos usos políticos que foram direcionados ao MAR, as representações endossadas pela Administração Eduardo Paes, via de regra, sublinhavam que o equipamento cultural estabelecia interlocuções com as histórias da cidade do Rio. A esse respeito, como já foi sublinhado, convém relembrar que as memórias não despontam de maneira espontânea. Algo, portanto, que concorre para que pensemos o MAR, bem como a sua intensa divulgação em jornais, programas televisivos, revistas e mídias digitais, a partir das intencionalidades interessadas em fixar, ensinar e difundir algumas narrativas sobre a cidade e sua gente.

Esse anseio do MAR em fixar, ensinar e propalar algumas narrativas contribuiu para que, dentro dos recortes conferidos por este estudo, esforçássemos para enfocá-lo como parte integrante de um projeto político de governo das populações encampado pelo prefeito Eduardo Paes. Nesse sentido, aquelas circunstâncias que antecederam a sua elaboração, acompanharam a sua construção e permaneceram após a sua inauguração foram perscrutadas como indiciárias de investimentos que, também, ansiaram apagar/silenciar aspectos de um passado relativamente recente – determinadas memórias da ditadura, particularmente, obras públicas advindas das “Reformas Urbanas” (1960-1975). Dentre essas, talvez a mais impactante tenha sido, como foi explorado, a demolição do Elevado da Perimetral.

A respeito, ainda, desse projeto político de governo das populações, convém projetar luzes para outra iniciativa relacionada aos festejos dos 450 anos do Rio que se embaralha e se confunde com o Projeto Porto Maravilha, com o MAR e seus esforços para fixar, ensinar e propalar algumas narrativas para a cidade e sua gente. Trata-se do Pró-Carioca (Programa de Valorização da Memória e da Cultura Popular Carioca), instituído pelo Decreto n.º 38 724/14 da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro. Sobre esse particular, de largada, torna-se interessante iluminar algumas passagens do próprio texto do Decreto, para que sejam indiciados alguns dos aspectos que estimularam a sua elaboração:

CONSIDERANDO o Decreto nº 38.146 de 5 de dezembro de 2013 que dispõe sobre as comemorações dos 450 anos da fundação histórica da cidade do Rio de Janeiro e seu objetivo de promover e incentivar as atividades e projetos alusivos à cultura, à memória e à identidade do povo carioca [ênfase adicionada];

CONSIDERANDO que o simbolismo dos 450 anos representa ocasião de celebração da memória do Rio, de seus personagens, de seus múltiplos movimentos e expressões artísticas, e da diversidade das manifestações culturais e sociais do povo carioca, na condição de protagonista de sua história [ênfase adicionada].

(Prefeitura da Cidade do Rio, Decreto n.º 38 724, 2014)

Dentre os investimentos referentes à promoção e ao incentivo à memória, à identidade, à história do povo carioca, os artigos 5.º e 6.º foram bastante interessantes para aquilo que queremos explorar:

Art. 5.º As escolas públicas municipais deverão executar, semanalmente, em cerimônia própria e de forma simultânea, o Hino da Cidade do Rio de Janeiro e o hasteamento da bandeira municipal.

Art. 6.º A Secretaria Municipal de Educação incentivará o desenvolvimento de trabalhos pedagógicos e ações alusivas à história da Cidade, à cultura popular carioca, a seus personagens e a suas manifestações artísticas, especialmente no período das comemorações da fundação dos 450 anos da cidade.

(Prefeitura da Cidade do Rio, Decreto n.º 38 724, 2014Prefeitura da Cidade do Rio. (2014). Decreto n.º 38 724, Programa de Valorização da memória e da cultura popular carioca. https://doweb.rio.rj.gov.br/portal/visualizacoes/pdf/2423#/p:5/e:2423?find=Decreto%2038.724
https://doweb.rio.rj.gov.br/portal/visua...
)

Pela leitura, despontam novamente aspectos relacionados às ações promovidas pela Administração Municipal que buscavam impulsionar articulações entre as memórias, as identidades, as narrativas da cidade e a invenção de tradições no meio social carioca. Para tanto, atenções especiais teriam que ser direcionadas, também, para aquela modalidade de intervenção social que poderia estimular a emergência de “um conjunto de práticas normalmente reguladas por regras tácitas ou abertamente aceitas; [que] visam inculcar certos valores e normas de comportamentos através da repetição” (Hobsbawm, 1984Hobsbawm, E. (1984). Introdução: a invenção das tradições. In Hobsbawm, E. & Ranger, T. (orgs.), A invenção das tradições (pp. 9-23). Paz e Terra., p. 9). A alusão, neste ponto, é para a escolarização primária, especialmente, em função de sua capacidade de cotidianamente incutir, despertar, difundir, enfim, inventar as novas tradições, “mobilizando sentimentos, experiências e símbolos” (Boto, 2014Boto, C. (2014). A liturgia da escola moderna: saberes, valores, atitudes e exemplos. História da Educação, 18(44), 99-127., p. 102).

As conversões do hasteamento da bandeira da cidade e do entoar do seu hino em atividades pedagógicas semanais tornam-se bastante significativas. Afinal, como já vem sendo explorado pelos estudos na área da História e no campo da História da Educação, o epíteto de Cidade Maravilhosa tem sido objeto de controvérsias.

Segundo Clarice Nunes (1996)Nunes, C. (1996). Cultura escolar, modernidade pedagógica e política educacional no espaço Urbano Carioca. In M. M. Herschmann (org.), Missionários do progresso: médicos, engenheiros e educadores no Rio de Janeiro, 1870-1937 (pp. 155-224). Diadorim Editora Ltda. e Renato C. Gomes (1994)Gomes, R. C. (1994). Todas as cidades, a cidade: literatura e experiência urbana. Rocco., foi a poetisa francesa Jeanne Catulle Mendès, em visita à cidade do Rio, em 1912, a primeira a cunhar a expressão. Já para Oswaldo P. Rocha (1986)Rocha, O. P. (1986). A era das demolições: cidade do Rio de Janeiro, 1870-1920. Secretaria Municipal de Cultura/Departamento Geral de Documentação e Informação Cultural. e Sidney Chalhoub (1986)Chalhoub, S. (1986). Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque. Brasiliense., coube a Coelho Neto, em 1908, o primado da adjetivação. Controvérsias à parte, sua ampla popularização aconteceu em função da marcha de carnaval composta por André Filho (Antônio André de Sá Filho), em 1934, oficializada como hino da cidade em 1960 – que, como analisamos, foi o momento em que as “Reformas Urbanas” tiveram início.

Essas considerações referentes tanto à consolidação do epíteto (por que, afinal de contas, “Maravilhosa”?) quanto aos investimentos que foram mobilizados para a celebração dos 450 anos (o Projeto Porto Maravilha, o MAR, o Pró-Carioca) sinalizam que os esforços para fixar, ensinar e difundir determinados sentidos históricos (como o exemplo que trabalhamos: a tentativa de apagar algumas das iniciativas encampadas pelo regime ditatorial) permanecem ocupando espaços privilegiados na agenda de preocupações das ações de governo. Iluminar, ainda que de modo exploratório, algumas destas mobilizações e esforços pode contribuir, quem sabe, para que aventemos a possibilidade de construir outros projetos de formação e de educação para esta cidade e sua gente. Ao menos, esta é a nossa expectativa e, em certo sentido, o nosso convite.

  • 1
    Dossiê temático organizado por: José Cláudio Sooma Silva <https://orcid.org/0000-0003-3647-8703> e José Antonio Miranda Sepulveda <https://orcid.org/0000-0003-4460-7704>
  • 3
    Normalização, preparação e revisão textual: Vera Lúcia Fator Gouvêa Bonilha <verah.bonilha@gmail.com>
  • 4
    Apoio: CAPES-PROEX-Projeto 0446/2021.
  • 5
    Segundo o ex-presidente Bolsonaro, o golpe de 1964, que ele chama de movimento, ocorreu em defesa da democracia. Em 2021, ele ordenou que os Comandos Militares comemorassem o aniversário da Revolução (movimento). Em nota publicada na Ordem do Dia, assinada pelos três comandos das Forças Armadas o, então, Ministro da Defesa Walter Braga Neto (que substituiu naquele mesmo dia o Ministro Fernando Azevedo e Silva) ressaltou, na frase de abertura do documento, que “o Movimento de 1964 é um marco para a democracia brasileira. O Brasil reagiu com determinação às ameaças que se formavam àquela época”. Tal acontecimento explicita a tese defendida pelo ex-presidente de que o golpe foi feito para evitar uma revolução comunista no Brasil, portanto, foi feito em nome da democracia. Tais informações conflituosas são pistas para uma compreensão de que o projeto de nação defendido pelo atual governo pretende rever e negar a história do Brasil, inventando novas tradições. A esse respeito, ver: <https://abn.com.br/forcas-armadas-divulgam-ordem-do-dia-alusiva-ao-31-de-marco-de-1964/>. <https://veja.abril.com.br/politica/bolsonaro-quer-quarteis-comemorando-golpe-de-64-generais-sugerem-cautela/>.
  • 6
    Dentre as inúmeras pesquisas que analisaram a construção de Brasília e os rebatimentos políticos, econômicos, sociais e culturais para o Rio de Janeiro, conferir: Abreu (2006)Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP., Almino (2007)Almino, J. (2007). O mito de Brasília e a literatura. Revista de Estudos Avançados, 21(59), 299-308. e Freitag (2003)Freitag, B. (2003). Brasília refletida. In W. Hermuche, Abstrata Brasília Concreta. Medialecom..
  • 7
    Para maiores esclarecimentos acerca das realizações urbanísticas da Lacerda, conferir os trabalhos de Perez (2007)Perez, M. D. (2007). Lacerda na Guanabara: a reconstrução do Rio de Janeiro nos anos 1960. Odisseia Editorial., Gasparini (2004)Gasparini, C. A. (2004). Carlos Lacerda e o golpe militar de 1964. Proj. História, 29(2), 619-626. e Leal (1997)Leal, M. da G. de F. (1997). O processo decisório na política urbana de Carlos Lacerda. [Tese de Doutorado]. Universidade Federal Fluminense, Niterói..
  • 8
    Sobre a remoção das comunidades no Rio de Janeiro, conferir: Abreu (2006)Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP., Brum (2012)Brum, M. S. I. (2012). Cidade Alta: história, memorias e estigma de favela num conjunto habitacional do Rio de Janeiro. Ponteio. e Cardoso (2009Cardoso, E. D. (2009). Segregação socioespacial e a invenção da Zona Sul. [Tese de Doutorado]. Universidade Federal Fluminense, Niterói., 2010)Cardoso, E. D. (2010). Estrutura urbana e representações: a invenção da Zona Sul e a construção de um novo processo de segregação espacial no Rio de Janeiro nas primeiras décadas do século XX. GeoTextos, 6(1), 73-88..
  • 9
  • 10
  • 11
    De acordo com as reflexões de Lia Faria (2011)Faria, L. (2011). Chaguismo e brizolismo: territorialidades políticas da escola fluminense. Quartet., o chaguismo, sobretudo, se manifestava em práticas clientelistas com a utilização da denominada “máquina política” para fazer emergir expedientes antidemocráticos.
  • 12
    Segundo Trindade (2000)Trindade, A. de A. (2000). O estilo político da Bica D'água: o chaguismo na Guanabara 1969-1974. Texto Cpdoc, 37., o uso da expressão “bica d’água” refere-se à forma clientelista e regionalista com que Chagas Freitas governava o estado. Como o problema de abastecimento d’água era muito grave, o governador fazia alianças com políticos locais e criava um estilo de fazer política preocupado, sobretudo, com a composição dos interesses locais e com o atendimento das demandas da população (oferta d’água), associado ao investimento feito nas eleições, através da valorização do voto. http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/antonio-de-padua-chagas-freitas>.
  • 13
    O governador Wilson Witzel – eleito para exercer o mandato de 2019 a 2023 – sofreu um processo de impeachment, que culminou em sua cassação em abril de 2021.
  • 14
    Para maiores informações, conferir: <https://diariodorio.com/historia-do-elevado-da-perimetral/>.
  • 15
  • 16
    Para entender os impactos das reformas urbanas vinculadas ao parque do Flamengo e suas consequências para a cidade, conferir: Oliveira (2006)Oliveira, A. R. de. (2006). Parque do Flamengo: instrumento de planificação e resistência. Arquitextos, 79(5), 1-7., Abreu (2006)Abreu, M. de A. (2006). Evolução Urbana do Rio de Janeiro (4. ed.). IPP., Perez (2007)Perez, M. D. (2007). Lacerda na Guanabara: a reconstrução do Rio de Janeiro nos anos 1960. Odisseia Editorial. e Leal (1997)Leal, M. da G. de F. (1997). O processo decisório na política urbana de Carlos Lacerda. [Tese de Doutorado]. Universidade Federal Fluminense, Niterói..
  • 17
    Segundo Eduardo Paes, em publicação no jornal O Dia (5 de dezembro de 2014), a Perimetral dividia a cidade como um “Muro de Berlim”. <https://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-12-05/eduardo-paes-compara-derrubada-da-perimetral-a-queda-do-muro-de-berlim.html>.
  • 18
    Ao todo, foram roubadas seis vigas: cinco tinham 40 m de comprimento por 6 m de largura e outra, 25 m por 6 m de espessura. O valor estimado das vigas, em 2013, era de R$ 100 mil. <https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/10/1354722-policia-diz-que-roubo-vigas-foi-bem-planejado-e-durou-uma-semana.shtml>.
  • 19
    O marco legal para requalificar a Região Portuária se deu com a criação da Operação Urbana Consorciada em dezembro de 2009, a partir da aprovação das Leis Municipais Complementares 101 e 102. A legislação criou o Porto Maravilha, fixou regras para o investimento em infraestrutura da área com recursos da venda dos Certificados de Potencial Adicional de Construção (CEPACS) e instituiu a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP) para implantar o projeto.
    Dois acontecimentos contribuíram, decisivamente, para implementar essa iniciativa: a seleção do Brasil para a realização da Copa do Mundo de Futebol de 2014 e a escolha da cidade para sediar a Olimpíada de 2016. As expectativas despertadas para concretizar esses eventos concorreram para a formação de uma atmosfera propícia em relação a investimentos e alianças entre as esferas do governo municipal, estadual e federal, com objetivo de arrecadar verba junto à iniciativa privada
  • 20
    À guisa de ilustração, ao lado daquelas registradas anteriormente, convém destacar a construção do Túnel Rio 450, a inauguração do Túnel Prefeito Marcello Allencar e a implementação das linhas dos Veículos Leves sobre Trilhos.
  • 21
    Essa aproximação entre o Barão Georges Eugène Haussmann e o Pereira Passos já é bastante divulgada. Contudo, duas outras dimensões envolvidas neste cognome – “Haussmann Tropical” – são menos conhecidas: 1) Pereira Passos acompanhou pessoalmente, como funcionário da embaixada brasileira em Paris, de 1857 a 1860, a remodelação da capital francesa. Durante 17 anos (1853-1870), Haussmann foi o responsável principal pelo planejamento da cidade; 2) Pereira Passos, de 1880 a 1881, frequentou cursos na Sorbonne e no Collège de France (Azevedo, 2003Azevedo, A. N. de (2003). A reforma Pereira Passos: uma tentativa de integração urbana. Revista Rio de Janeiro, 10, 35-63.; Benchimol, 1992Benchimol, J. L. (1992). Pereira Passos, um Haussman Tropical: a renovação urbana da cidade do Rio de Janeiro no início do século XX. Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes/Departamento Geral de Documentação e Informação Cultura/Divisão de Editoração.; Pinheiro & Fialho Júnior, 2006Pinheiro, M. C., & Fialho Júnior, R. da C. (2006). Pereira Passos, vida e obra. Rio Estudos (Coleção Estudos da Cidade, pp. 1-14). IPP/SMU/Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.).
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  • 23
    Esse periódico foi lançado em março de 2010 e contou com 22 edições, sendo a última de dezembro de 2016. Como o próprio nome sugere, tratava-se de uma iniciativa editorial voltada, sobretudo, para a divulgação das benesses e maravilhas que seriam alcançadas a partir, e em função, das reformas empreendidas.
  • 24
    Foi inaugurada em julho de 2012 e funcionou até o final 2015. Tratava-se de um espaço de exposições que tencionava familiarizar a população com as intervenções urbanas, advindas do Projeto Porto Maravilha, por meio de mapas, infográficos, fotos e vídeos das obras e perspectivas (Carvalho, 2018Carvalho, M. R. B. de. (2018). O MAR, a Cidade e as Histórias: sobre algumas das invenções do setor educativo. [Monografia de Graduação]. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.).
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    O Instituto Odeon é uma associação privada de caráter cultural, sem fins lucrativos, que tem a missão de promover a gestão e a produção cultural e artística de excelência, em diálogo com a educação, agregando valor público para a sociedade. O Instituto foi formado a partir de uma ampliação da Odeon Companhia Teatral, organização criada em 1998. Tendo sido qualificado como Organização Social (OS) no Rio de Janeiro, o Instituto Odeon tornou-se, em 2012, parceiro da prefeitura na gestão do Museu de Arte do Rio – MAR. <http://institutoodeon.org.br/conheca-o-instituto/>.

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Editor responsável: André Luiz Paulilo <https://orcid.org/0000-0001-8112-8070>

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    12 Abr 2021
  • Revisado
    28 Set 2021
  • Aceito
    10 Dez 2021
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