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O modelo das duas rodas: uma referência para o sistema de gestão da inovação em pequenas e médias empresas

Bagno, Raoni Barros; Faria, Adriana Ferreira de. O modelo das duas rodas: uma referência para o sistema de gestão da inovação em pequenas e médias empresas. Viçosa, Minas Gerais: Universidade Federal de Viçosa, 2017. 167. 9788572695824

O livro O modelo das duas rodas: uma referência para o sistema de gestão da inovação em pequenas e médias empresas traz as bases teóricas e metodológicas para organização, direcionamento e sistematização da gestão da inovação nas empresas. Na obra, a inovação é apontada como o elemento-chave para a agregação de valor aos produtos, contribuindo para o fortalecimento, modernização e diversificação da indústria.

Essa abordagem é apresentada no capítulo I (Inovação e competitividade), no qual os autores descrevem a importância da inovação para as empresas (competitividade e sobrevivência), seus tipos (produto, processo, organizacional e modelo de negócios), princípios teórico-conceituais (diferenciação entre inovação estratégica ou tática e de negócios ou operacional) e definição (exploração de novas ideias com sucesso).

De modo geral, os conceitos e definições descritos nesse capítulo são formalizados em linguagem empresarial e direta, o que reflete a característica aplicada ao modelo. É importante salientar que o modelo foi concebido com o objetivo de sugerir ações organizadas para o planejamento, estruturação e implantação de um programa de inovação nas indústrias.

No capítulo II (Visão geral do MDR), os autores explicam o modelo proposto, mostrando como foram organizados os procedimentos e as ferramentas de gestão da inovação que, sistematizados, simplificam e contribuem para perenizar a inovação nas empresas.

O modelo foi organizado em quatro grupos - comitê estratégico (CE), comitê de implantação (CI), equipes de projetos e organização do trabalho -, sendo que cada um possui um conjunto de responsabilidades e tarefas. Em especial, as responsabilidades e tarefas do CE e do CI são organizadas em um ciclo de planejamento, execução, checagem e aprimoramento (PDCA). Essa organização em duas rodas de PDCA é ilustrada na Figura 1.

FIGURA 1
Esquema geral do modelo de duas rodas (MDR)

A organização e atribuição das responsabilidades e atividades do CE e do CI, por intermédio do ciclo de PDCA, são bem definidas pelos autores, assim como os processos, metas e ferramentas de controle das atividades dos comitês. Contudo, eles não deixam claro quais são os recursos humanos necessários para que as empresas organizem os comitês e executem as tarefas, o que dificulta, nesse sentido, a estimativa dos custos na realização das tarefas de gestão de inovação, recomendadas pelo modelo. Dessa forma, é pertinente questionar a capacidade de pequenas empresas em executarem o modelo, restringindo sua aplicação.

No capítulo III (Módulo do comitê estratégico), são detalhados o papel e as responsabilidades da alta administração da empresa no programa, tais como a definição das políticas e estratégias de inovação, a alocação de recursos humanos e financeiros, o monitoramento das atividades e o controle do desempenho do programa. Essas ações do CE são:

  • P (planejar) - como são definidos e documentados os objetivos de inovação em um plano estratégico (PEI);

  • D (executar) - ações previstas no PEI são executadas pelo CI (segunda roda) e equipes de projetos. As métricas estabelecidas no PEI são traduzidas em indicadores de resultado e aplicadas pelo CI;

  • C (acompanhamento e verificação) - os objetivos estratégicos de inovação são analisados. Nessa fase, o CE avalia se os objetivos estratégicos estão sendo alcançados;

  • A (aprimoramento) - os resultados alcançados são analisados pelo CE. Por conseguinte, ações corretivas e de melhoramentos no PEI são propostas e, em seguida, executadas pelo CI.

O detalhamento das ações atribuídas ao CE, assim como os esclarecimentos sobre as ferramentas utilizadas, é bem exposto. No entanto, a quantidade de ações atribuídas ao CE parece extrapolar a realidade na dinâmica de trabalho no dia a dia das empresas. Nesse caso, há certa despreocupação dos autores em relação às restrições de tempo da alta direção na elaboração do PEI e demais responsabilidades.

No capítulo IV (Módulo do comitê de implantação), os autores detalham o segundo ciclo de PDCA, em que se concentra a maior parte das atividades para a execução do modelo de gestão da inovação nas empresas. Na etapa P (planejar), seguindo os objetivos estratégicos de inovação definidos no PEI, são realizadas a composição, priorização e gestão do portfólio de projetos de inovação. Na etapa D (executar), são elaborados o orçamento e o cronograma do projeto, bem como designadas as pessoas que irão compor as equipes de projetos. Na etapa C (acompanhamento e verificação), com a ferramenta de gestão de portfólio e do plano agregado de projetos (GP-PAP), é feito o controle dos projetos em execução. Com o GP-PAP, o CI verifica a necessidade de cancelar, suspender ou alterar a ordem de prioridade dos projetos que estão sendo executados ou em portfólio. Na etapa A (aprimoramento), é realizada a avaliação do portfólio de projetos, verificando falhas e acertos, gerando e enviando relatórios de desempenho para que o CE possa aprimorar o programa.

As ações táticas e operacionais, tais como as ferramentas relacionadas ao CI, são apresentadas em detalhe e com clareza. Todavia, ainda nesse capítulo, os recursos humanos mínimos necessários para realizar as diversas atividades neste módulo não são explicados, apenas sugere-se que as empresas precisariam de pessoal com dedicação exclusiva para operar o programa.

No capítulo V (Módulo das equipes de projetos), os autores detalham o desenvolvimento dos projetos de inovação (PD-Projetos). O PD-Projetos aplica o método de pontos de decisão (stage-gates) de Cooper (1990COOPER, R. G. Stage-gate systems: a new tool for managing new products. Business Horizons, v. 33, n. 3, p. 44-54, 1990.). No referido modelo, com a sistematização deste método, os projetos de inovação têm seus riscos e incertezas gerenciados durante todas as fases de desenvolvimento. Como ferramenta de pontos de decisão, as análises de resultados são feitas em estágios, possibilitando a antecipação de decisões. A gestão de projetos é acompanhada pelo CI, contribuindo para a manutenção do alinhamento entre as equipes de projeto e as etapas anteriores do modelo. Nesse caso, parte-se da etapa P (planejamento) da primeira roda, seguindo os objetivos estratégicos de inovação da organização e percorrendo todo o modelo até a etapa A (aprimoramento), da segunda roda, entregando os relatórios das inovações desenvolvidas.

Possivelmente, a ferramenta de PD-Projetos é, entre as inovações de processo desenvolvidas no MDR, a mais complexa de se implantar. Por outro lado, essa ferramenta pode contribuir, em muitas empresas, para o avanço na gestão de projetos tradicionais e/ou de inovação.

O capítulo VI (Módulo de organização do trabalho) descreve a importância do envolvimento das pessoas no processo de inovação da empresa e apresenta o módulo responsável por esse ponto. Tal módulo tem como desafio fomentar a cultura organizacional para a inovação, discutindo e disseminando conhecimentos, gerando e promovendo ações que envolvam as pessoas na implantação do programa.

Os autores destacam a importância desse módulo no modelo, apontando a necessidade do engajamento das pessoas, independentemente do nível ou função, para que a inovação seja sistêmica, sustentável e resistente. Conquanto, esse destaque dos autores se contrapõe à inexistência de processos, tarefas, metas ou controles que pudessem estruturar e sistematizar o módulo. A ausência de métodos para desenvolver competências, estimular e valorizar ideias, disseminar e fortalecer a cultura da inovação sugere certo descuido dos autores para com o módulo de organização do trabalho. Além disso, os autores não esclarecem em qual comitê o grupo de organização do trabalho está subordinado, apenas afirmam que “as ações de cultura da inovação devem ser vivenciadas”.

Inovação para resultados, o Programa FAZ

O MDR é uma base teórico-metodológica do Programa FAZ, uma iniciativa da Federação das Indústrias do Estado de Minas, implantada em 43 empresas (FIEMG, 2016FIEMG, F. das I. de M. G. Guia da gestão da inovação: modelo das duas rodas. Belo Horizonte: Fiemg, 2016.). Apesar de não constar no livro, a implantação do FAZ reflete, de certo modo, a adequação das bases teórico-conceituais da obra à realidade das empresas. Os resultados da implantação do MDR em 22 empresas foram analisados por Aniceto et al. (2016ANICETO, D. M.; BAGNO, B. R.; ALFRADIQUE, P. H. M.; DE SOUZA, G. F. M. Avaliação de um modelo de Sistema de Gestão da Inovação a partir da experiência de implantação em empresas mineiras. In: X WORKSHOP IGDP. Anais... Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 110-114.) e exemplificados por Oliveira e Resende (2016OLIVEIRA, M.; RESENDE, D. Programa inovação: fonte de ideias para melhoria contínua. In: X WORKSHOP IGDP. -Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 260-263.), Libório et al. (2016) e Oliveira et al. (2016).

De modo prático, a organização das tarefas e das responsabilidades em comitês se mostrou inadequada. Nem todas as empresas tinham recursos humanos suficientes para seguir as recomendações dos autores. Além disso, contrariando as sugestões dos pesquisadores, os trabalhos relacionados aos objetivos e estratégias do PEI foram executados pelo CI. Assim, o papel do CE para o plano estratégico de inovação se resumiu à sua aprovação. Isso corrobora a ideia da restrição de tempo da alta administração na execução de atividades do programa. Não obstante, de acordo com Aniceto et al. (2016ANICETO, D. M.; BAGNO, B. R.; ALFRADIQUE, P. H. M.; DE SOUZA, G. F. M. Avaliação de um modelo de Sistema de Gestão da Inovação a partir da experiência de implantação em empresas mineiras. In: X WORKSHOP IGDP. Anais... Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 110-114.), a mudança de responsabilidades não interferiu nos resultados que, no módulo do CI, não foram satisfatórios.

Segundo Libório et al. (2016), em relação ao CI, que concentra grande parte das tarefas do programa, apenas as empresas com recursos humanos dedicados conseguiram elaborar e executar o PEI, implantar programas de geração de ideias (OLIVEIRA; RESENDE, 2016OLIVEIRA, M.; RESENDE, D. Programa inovação: fonte de ideias para melhoria contínua. In: X WORKSHOP IGDP. -Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 260-263.) e desenvolver projetos de inovação (OLIVEIRA et al., 2016). Por isso, sugere-se o desenvolvimento de um MDR simplificado para pequenas empresas.

Os procedimentos e objetivos do método de stage-gates foram apontados por muitas empresas como o ponto forte do MDR. Esse método, conforme Oliveira et al. (2016OLIVEIRA, M.; RESENDE, D. Programa inovação: fonte de ideias para melhoria contínua. In: X WORKSHOP IGDP. -Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 260-263.), dinamiza a gestão dos projetos e possibilita intervenções emergenciais, circunstanciais ou pontuais, dando clareza e consistência às ações de controle do portfólio. Contudo, na maioria das empresas, o processo de stage-gates não foi implantado, sendo considerado complexo e/ou difícil de compreender.

Por fim, a inexistência de métodos e de processos para planejar, executar, checar e aprimorar iniciativas de estimulo à cultura da inovação se refletiu na baixa qualidade e quantidade dessas iniciativas. A ausência de sistematização, diferentemente do encontrado nos módulos anteriores, evidencia que o módulo da organização do trabalho não recebeu a importância que foi destacada pelos autores no capítulo VI.

Referências bibliográficas

  • ANICETO, D. M.; BAGNO, B. R.; ALFRADIQUE, P. H. M.; DE SOUZA, G. F. M. Avaliação de um modelo de Sistema de Gestão da Inovação a partir da experiência de implantação em empresas mineiras. In: X WORKSHOP IGDP. Anais... Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 110-114.
  • COOPER, R. G. Stage-gate systems: a new tool for managing new products. Business Horizons, v. 33, n. 3, p. 44-54, 1990.
  • FIEMG, F. das I. de M. G. Guia da gestão da inovação: modelo das duas rodas. Belo Horizonte: Fiemg, 2016.
  • LIBORIO, M. P.; FUJIMOTO, N. A.; SILVA, I. S.; LUIZ, W.; LAUDARES, S.; PAIVA, S. da.; MARTINS, C. A. Programa INOVAR de gestão da inovação: características e dificuldades em PD & I no setor de telecomunicações. In: X WORKSHOP IGDP. -Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, set. 2016. p. 228-232.
  • OLIVEIRA, C. C.; LIBORIO, M. P.; FUJIMOTO, N. A.; SIBELE SILVA, I.; LAUDARES, S. Desenvolvimento de sistema de atendimento a incidentes em redes de telecomunicações. In: X WORKSHOP IGDP. -Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 245-249.
  • OLIVEIRA, M.; RESENDE, D. Programa inovação: fonte de ideias para melhoria contínua. In: X WORKSHOP IGDP. -Betim, MG: Instituto de Inovação e Gestão de Desenvolvimento do Produto, 2016. p. 260-263.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    14 Dez 2017
  • Revisado
    07 Mar 2018
  • Aceito
    27 Mar 2018
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