Banner Portal
Sobre a invenção da mulata
PDF

Palavras-chave

Raça. Mulata. Literatura

Como Citar

CORRÊA, Mariza. Sobre a invenção da mulata. Cadernos Pagu, Campinas, SP, n. 6/7, p. 35–50, 2010. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/1860. Acesso em: 26 abr. 2024.

Resumo

Resumo

 

Boa parte dos autores que trabalham com o sistema de classificações raciais no Brasil subscreve a descrição que Patrícia Birman faz dele: “privilegia-se um certo continuum de relações ao invés de estabelecer campos com fronteiras em domínios excludentes”. Tal sistema, “que permite a seus integrantes possuir posições variadas, referidas a mais de uma dimensão”, tornaria de difícil aplicação a noção de identidade. Exatamente o oposto parece ocorrer com o sistema de classificações de gênero no qual o par masculino/feminina tenta estabelecer com clareza aquelas fronteiras, isto é, desmentir, simbólica ou socialmente, a possibilidade de um continuum entre os dois pólos. Na literatura sobre a questão das relações raciais, a figura do mulato é sempre invocada como prova daquela escala; já a da mulata que pareceria oferecer a resolução cultural dessa incompatibilidade entre o sistema de classificações racial e o de gênero, pouco se fala. Mas como se constituiu historicamente essa figura tão contraditória, que parece ora renegar, ora confirmar um e outro sistema? Figura tão idêntica a si mesmo nos discursos médicos, literários ou carnavalescos que a singularizaram com tanta nitidez que parece não haver nenhuma descontinuidade entre a mulata das lavagens do Bonfim dos tempos de Nina Rodrigues e a “mulata globeleza” dos dias de hoje.

 

Abstract

 

Most of the authors working on the racial classification system in Brazil would subscribe Patricia Birman’s description of it: “rather than establishing fields with excluding thresholds, privilege is given to a continuum of relationships”. Such a system “allows its members to occuppy different positions, each related to different dimensions of it”, therefore making difficult the use of the notion of identity. The opposite seems to hold for the gender classification system, in which the masculine/feminine opposition tries to establish a clear delimitation of those thresholds, that is, to establish that there is no social or simbolic possibility of a continuum here. The mulatto trope is always invoked in the literature as a demonstration that such a continuum does not exist, but almost nothing is said about the mulata – which seemingly could help to resolve this cultural incongruity between national racial and gender classification systems. How was such a contradictory trope (the mulata) – that seems to validate and to invalidate, by turns, both systems of classification – historically invented. She emerges so neatly in medical discourses as in the nineteenth century descriptions of her or in the use/abuse television networks make today of her as a trademark.

PDF

Referências

“As ilusões da liberdade – a escola Nina Rodrigues e a antropologia no Brasil”, São Paulo, Universidade de São Paulo, 1982.

“Dialética da malandragem”. Jornalivro (8), agosto de 1972; originalmente publicado na Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (8), 1970.

“Raça e gênero: o papel da analogia na ciência”. In: BUARQUE DE HOLLANDA, Heloisa (org.). Tendências e Impasses – o feminismo como crítica da cultura. Rio de Janeiro, Rocco, 1994.

“Situated knowledges: the science question in feminism and the privilege of partial perspective”. In: HARAWAY, Donna. Simians, cyborgs, and women – the reinvention of nature, New York, Routledge, 1991 (Tradução em Cadernos Pagu (5), 1995)

A passion for difference, essays in anthropology and gender. Bloomington and Indianapolis, Indiana University Press, 1994.

ASSIS, Machado. Ao vencedor as batatas. São Paulo, Livraria Duas Cidades, 1977, p.166.

BEHN'S, Aphra. “The widow ranter”. In: HENDRICKS, Margo e PARKER, Patricia (eds.). Women, "race" & writing in the early modern period. London & New York, Routledge, 1994.

BIRMAN, Patricia. Construção da negritude: notas preliminares, em Cativeiro e Liberdade. Rio de Janeiro, UERJ, 1989.

CORRÊA, Mariza. “Generat genus justitiam?”. Revista USP (21), março/ abril/maio, 1994, para um exemplo no âmbito da justiça penal, e Peter Fry p.106

CORRÊA, Mariza. “Mulher e família: um debate sobre a literatura recente”. Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais (18), 1984 (reproduzido em O que se deve ler em ciências sociais no Brasil (3), São Paulo, ANPOCS/Cortez, 1990.

COSTA, Jurandir Freire. História da psiquiatria no Brasil. Rio de Janeiro, Editora Documentário, 1976.

DA MATTA, Roberto. Relativizando: uma introdução à antropologia social. Petrópolis, Vozes, 1981.

DEGLER, Carl. Neither black nor white. New York, The Macmillan Company, 1971.

FRY, Peter. Para inglês ver. Rio de Janeiro, Zahar editores, 1982, capítulo III.

GAYOSO, Raymundo José de Sousa. Compêndio históricopolítico dos princípios da lavoura no Maranhão. São Luís/Rio de Janeiro, Editora Livros do Mundo Inteiro, 1970.

GILLIAM, Angela e Onik’a. “Negociando a subjetividade da mulata no Brasil”. Estudos Feministas, (“Dossiê Mulheres Negras”), 3(2), 1995.

GONZALES, Lélia. “Racismo e sexismo na cultura brasileira”. Ciências Sociais Hoje (2), Brasília, ANPOCS, 1983.

GOULD, Stephen Jay. Darwin e os grandes enigmas da vida. São Paulo, Livraria Martins Fontes Editora, 1987.

GOULD, Stephen Jay. The mismeasure of men. New York, W.W. Norton & Company, 1981.

HEILBORN, Maria Luiza. “Fazendo gênero? A antropologia da mulher no Brasil”. In: COSTA Albertina de Oliveira e BRUSCHINI, Cristina (orgs.). Uma questão de gênero. Rio de Janeiro e São Paulo, Rosa dos Tempos/Fundação Carlos Chagas, 1992.

HENDRICKS, Margo. “Civility, barbarism”.

KLEIN, Herbert. “Os homens livres de cor na sociedade escravista brasileira”. Dados (17), 1978

LANDES, Ruth. A cidade das mulheres. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira S.A., 1967.

LAURETIS, Teresa de. (ed.) Feminist studies/critical studies. Bloomington, Indiana University Press, 1986.

Manoel Bomfim. In: SUSSEKIND, Flora e VENTURA, Roberto (eds.). História e dependência – cultura e sociedade em Manoel Bomfim. São Paulo, Editora Moderna, 1981.

NUNES, Maria Luísa. “Images of the woman of color in Brazilian literature: O cortiço, Clara dos Anjos, Gabriela, cravo e canela and O quinze”. In: STEADY, Filomina Chioma (ed.). The black woman cross-culturally. Vermont, Schenkman books, Rochester, 1985.

QUEIROZ Júnior, Teófilo de. Preconceito de cor e a mulata na literatura brasileira. São Paulo, Ática, 1975.

RABASSA, Gregory. O negro na ficção brasileira. Rio de Janeiro, Edições Tempo Brasileiro, 1965.

SEYFERTH, Giralda. “Os paradoxos da miscigenação: observações sobre o tema imigração e raça no Brasil”. Estudos Afro-asiáticos (20), junho de 1991.

SILVA, Nelson do Valle. “Uma nota sobre ‘raça social’ no Brasil”. Estudos Afro-asiáticos (26), setembro de 1994.

SKIDMORE, Thomas. Preto no branco – raça e nacionalidade no pensamento brasileiro. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976.

STOCKING Jr., George. Race, culture and evolution. Chicago, University of Chicago Press, 1968.

STOLER, Ann L. “Making empire respectable: the politics of race and sexual morality in 20th-century colonial cultures” American Ethnologist 16(4), november 1989.

SUSSEKIND, Flora. Tal Brasil, qual romance?. Rio de Janeiro, Achiamé, 1984.

Tanto preto quanto branco: estudos de relações raciais. São Paulo, T. A. Queiroz Editor, 1985.

VIANNA, Hermano. O mistério do samba. Rio de Janeiro, Jorge Zahar editor/Editora da UFRJ, 1995.

Downloads

Não há dados estatísticos.