Resumo
O debate sobre a trajetória da economia brasileira na primeira metade da década de 2010 é marcado pelo protagonismo da condução da política fiscal para explicar a desaceleração econômica e posterior recessão, tanto no campo da ortodoxia como da heterodoxia. A ortodoxia aponta o descontrole dos gastos públicos como responsável pela deterioração fiscal, que teria conduzido à piora das expectativas dos agentes e à queda dos investimentos. A heterodoxia, numa interpretação quase que oposta, aponta para uma inflexão da política fiscal: a redução dos gastos, em especial dos investimentos, no início da década, teria afetado a capacidade de indução da política em um modelo de crescimento puxado pela demanda. Este artigo tem como objetivo avaliar empiricamente essas explicações. Além de uma análise descritiva dos dados, utilizamos um modelo de Vetores Auto-Regressivos (VAR) para examinar como os elementos da política fiscal apontados por cada uma das perspectivas discutidas afetaram o crescimento econômico e, em especial, se são capazes de explicar a desaceleração e a recessão no período analisado. Os resultados indicam, contrariando a visão ortodoxa, que não ocorreu uma disparada dos gastos em relação a governos anteriores, e que os movimentos no produto tendem a preceder alterações no resultado fiscal, não podendo ser por eles explicados. Também apontam o impacto relevante do investimento público na evolução do produto, confirmando um elemento central da abordagem heterodoxa. Todavia, ao revelar que até 2014 os gastos públicos continuavam a crescer, indica a insuficiência da tese heterodoxa para explicar a desaceleração nos anos anteriores e a profundidade da subsequente recessão. Diante disso, apresentam-se elementos explicativos adicionais para compreender o período.
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