Resumo
Este artigo traz uma análise semântico-enunciativa da palavra ‘cité’ como objeto de definição lexicográfica nas nove edições do Dicionário da Academia Francesa, de 1694 a 1986-92. Os artigos do dicionário são analisados no modo como a sua organização textual predica a palavra-entrada. Destacam- se o sentido urbano de ‘cité’, posto pela relação com ‘ville’, e seu sentido político, marcado na raiz da palavra: o étimo latino ‘civitas’. A autora mostra que a introdução do sentido político, contrariando a marca etimológica, se dá na quinta edição, de 1798, posteriormente à do sentido urbano (presente desde a primeira edição) e está relacionada à Revolução Francesa, o que é ressignificado nas edições seguintes pela rememoração não só da Revolução, mas também da Antiguidade greco-romana, que reenvia à ‘pólis’ grega e à ‘civitas’ latina. Mostra também que o sentido político, ligado à governança, nem sempre está desvinculado de ‘ville’, e que por intermédio de ‘cité’, ‘ville’ se liga a ‘Estado livre’ e a ‘país’. ‘Ville’ é um predicado fundamental na definição de ‘cité’, pelo qual se produzem diferentes vínculos semânticos: ‘cité’ designa ora o mesmo que ‘ville’, ora uma parte da ‘ville’, ora um direito que pode ser exercido ou não na ‘ville’, ora um espaço delimitado pela fronteira com a ‘ville’, entre outras possibilidades. A análise dá visibilidade à forte relação polissêmica entre as duas palavras e às imprecisões e ambiguidades que configuram o presente da palavra-entrada nas diferentes edições.Referências
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