Artigo publicado na LIAMES – Línguas Indígenas Americanas traz importante contribuição de descrição linguística de língua indígena em avançado estágio de extinção

Artigo publicado na LIAMES – Línguas Indígenas Americanas traz importante contribuição de descrição linguística de língua indígena em avançado estágio de extinção

Por Angel Corbera Mori

O artigo mais acessado da LIAMES-Línguas Indígenas Americanas, no ano de 2017, foi “O warázu do Guaporé (tupi-guarani): primeira descrição linguística” de Henri Ramirez; Valdir Vegini e Maria C. V. de França, docentes da Universidade Federal de Rondônia (UNIR). O trabalho representa uma primeira descrição linguística do warázu, uma língua da família tupi-guarani falada pelos warazúkwe, povo indígena que habita certa região localizada na fronteira entre o Brasil e a Bolívia.

O warázu é uma língua em avançado estágio de extinção, ela é falada pelos warazúkwe, conhecidos também como guaraiutá, pauserna e guarasugwe. Os warazúkwe, apesar de ainda manterem sua identidade étnico-cultural, vivem negligenciados pelas políticas oficiais do Estado brasileiro e, muitas vezes, são referidos como índios bolivianos. Habitantes originários das regiões localizadas entre os rios Riozinho e Santa Cruz, os warazúkwe foram, aos poucos, sendo despojados de seu território tradicional pelos grileiros, fazendeiros e representantes do agronegócio; passando a morar nos municípios de Pimenteiras, Costa Marques e Vilhena (RO), no Brasil e também em Bela Vista, na Bolívia.

O texto publicado na revista LIAMES, vol. 17(2) é o resultado de um intensivo trabalho de campo realizado em sete semanas pelo pesquisador Henri Ramirez, junto ao casal Känätsü (José Frei Leite) e Hiwa (Ernestina Moreno); possivelmente, estes sejam os dois últimos falantes ativos da língua warázu.

O estudo, como bem enfatizam os autores, representa o primeiro, e, talvez, o último registro dessa língua. Os temas abordados no artigo incluem notas históricas acerca do contato da sociedade nacional com os warazúkwe, desde o período colonial até os tempos atuais, além de referências de estudos linguísticos constituídos por breves listas de palavras da língua. Contudo, as contribuições mais significativas dos autores foram: (i) um estudo comparativo da fonologia warázu e sua relação com outras línguas da família tupi-guarani, (ii) a análise morfológica da língua e (iii) um dicionário trilíngue, com entradas lexicais em warázu, português e inglês.

Na seção dedicada à fonologia, além da descrição dos fonemas consonantais e vocálicos, são abordadas várias regras e processos, tanto sincrônicos quanto diacrônicos, os quais mostram o estado atual do warázu em comparação à fonologia de outras línguas tupi-guarani, dentre elas: o guarani, o guarayu, o sirionó e o tupinambá. Na seção dedicada à morfologia, são analisados os prefixos pessoais, os nomes dependentes e nomes independentes. No que diz respeito aos nomes dependentes e independentes, os primeiros são nominais que ocorrem necessariamente atrelados a um possuidor, já os independentes são constituídos por nominais que podem ser possuídos ou não. Nessa mesma seção, destacam-se, igualmente, o tratamento dos verbo-nominais, os quais são nomes dependentes que ocorrem em função estritamente predicativa; e a morfologia dos verbos transitivos e intransitivos, que se diferenciam pelo uso dos prefixos pessoais associados à base verbal correspondente. Outros aspectos tratados na morfologia dizem respeito aos processos de transitivização e intransitivização, os marcadores verbais de tempo, aspecto e modo, além da ocorrência de diversos morfemas que operam como nominalizadores na gramática da língua.

O artigo de Ramirez, Vegini e França inclui uma lista comparativa de 100 palavras básicas em warázu, guarayu, sirionó e yuqui, com suas glosas correspondentes em português. Esta lista é de suma importância para os pesquisadores que se dedicam aos estudos diacrônicos das línguas tupi-guarani.

A última seção é dedicada ao dicionário, cuja apresentação é uma versão trilíngue: warázu, inglês e português. No dicionário, são utilizadas transcrições fonológicas, com entradas ordenadas alfabeticamente na língua warázu e suas correspondentes glosas em português e inglês. Em determinados casos, são incluídas glosas em castelhano da Bolívia, tendo como objetivo inserir os nomes científicos das entradas relacionadas a espécies de abelhas e plantas.

O texto, aqui brevemente comentado, é uma importante contribuição aos estudos das línguas indígenas, à linguística antropológica brasileira, e, sobretudo, representa um documento visível da existência dos warazúkwe e de sua língua, um povo tupi-guarani originário e, infelizmente, ignorado pela sociedade nacional envolvente.

 

REFERÊNCIA

RAMIREZ, Henri; VEGINI, Valdir; FRANÇA, Maria Cristina V. de. “O warázu do Guaporé (tupi-guarani): primeira descrição linguística”. LIAMES: Línguas Indígenas Americanas, Campinas, v. 17, n 2, p. 411-506, 2017. Disponível em: <https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/liames/article/view/8647468>. Acesso em: 27 nov. 2017.

COMO CITAR ESTE POST:

CÓRBERA MORI, Angel. Artigo publicado na LIAMES – Línguas Indígenas Americanas traz importante contribuição de descrição linguística de língua indígena em avançado estágio de extinção. Blog PPEC, Campinas, v.6, n.1, nov. 2017. ISSN 2526-9429. Disponível em: <http://periodicos.sbu.unicamp.br/blog/index.php/2017/11/28/liames1/>.  Acesso em: dia mês abreviado ano.

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