Resumo
A partir de variadas expressões poéticas – fotográfica, cinematográfica, pictórica e literária – proponho contornar a ideia de vivo. Minha série fotográfica Água viva desenha a aproximação de uma menina com as águas correntes da cachoeira. A criança entra em contato com a matéria do mundo e com o invisível da natureza, sem margens que os distingam. Naomi Kawase, em seu filme Floresta dos Lamentos, mostra-nos que atravessar a floresta é, necessariamente, ser atravessada por ela. A artista Wilma Martins constrói pictoricamente irrupções da floresta no cenário domiciliar e, assim, ela dá forma ao vínculo entre o real e o imaginário; entre o selvagem e o domesticado. A personagem G.H., de Clarice Lispector, vive uma epifania a partir do encontro com uma barata – ser arcaico, remoto, imemorial, travessia íntima e subjetiva que faz emergir o mais primitivo de si. Entre o mundo que olhamos e o que vemos, o visível e o invisível, a matéria e o espírito, humano e não humano, somos atravessados pela energia do vivo. Reativar, palavra-chave no vocabulário da filósofa belga Isabelle Stengers, leva-nos de volta em direção ao vínculo com os deuses, os espíritos, a terra e, com estas alianças, reativar o vivo se compõe.
Referências
BELTING, H. Antropologia da imagem. Lisboa: KKYM, 2014.
GULLAR, F. Invenção da alegria. In: MORAIS, F. (Org.). Wilma Martins. Rio de Janeiro: Tamanduá Arte, 2015.
KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das letras, 2019
LISPECTOR, C. A paixão segundo G.H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998
LÓPES, J. M. O cinema no umbral. In: MAIA, C.; MOURÃO, P. (Orgs.). O cinema de Naomi Kawase. Rio de Janeiro: CCBB RJ, 2011.
MARTIN, A. Certo canto escuro do cinema moderno. In: MAIA, C.; MOURÃO, P.(Orgs.). O cinema de Naomi Kawase. Rio de Janeiro: CCBB RJ, 2011.
MIRANDA, L. Dar à Luz. Naomi Kawase. In: MAIA, C.; MOURÃO, P. (Orgs.). O cinema de Naomi Kawase. Rio de Janeiro: CCBB RJ, 2011.
MORAIS, F. (org.). Wilma Martins. Rio de Janeiro: Tamanduá Arte, 2015.
SANTIAGO, S. Catálogo Galeria Graffiti, Rio de Janeiro, 1974. In: MORAIS, F. (Org.). Wilma Martins. Rio de Janeiro: Tamanduá Arte, 2015
STENGERS, I. No tempo das catástrofes: resistir à barbárie que se aproxima. Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. São Paulo: Cosac Naify, 2015.
STENGERS, I. Reativar o animismo. Trad. Jamille Pinheiro Dias. Cadernos de Leituras, n. 62. Edições Chão da Feira. Disponível em https://chaodafeira.com/wp-content/uploads/2017/05/caderno-62-reativar-ok.pdf. Acesso em: 30 mai. 2022.
STARHAWK. Magia, Visão e Ação. Trad. Jamille Pinheiro Dias. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n. 69, p. 52-65, 2018.
STARHAWK. Rêver l’obscure: femmes, magie et politique. Paris: Les Empêcheurs de penser en ronde/Le Seuil, 2003
SZTUTMAN, R. Reativar a feitiçaria e outras receitas de resistência – pensando com Isabelle Stengers. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 69, p. 338-360, 2018.

Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.
Copyright (c) 2023 Paula Huven