Resumo
O objetivo deste artigo é analisar as questões levantadas pelas principais estratégias de tradução mobilizadas entre 1964 e 1984 para traduzir as representações romanescas do joual – a saber, o socioleto, fortemente anglicizado e linguisticamente empobrecido falado pelas classes populares de Montreal – para leitores anglo-canadenses inquietos com o avanço do movimento independentista no Quebec e com a chegada ao poder, em 1976, do Partido Quebequense. Após apresentar as características sociolinguísticas do joual, assim como o duplo uso, político e literário, que dele fizeram alguns escritores a partir de 1960, trata-se de identificar os problemas de ordem lexical propostos aos tradutores e as diversas soluções que estes preconizaram. Isso nos permitiu descobrir 1) as imagens de si e do outro que essas soluções veiculam; 2) a natureza dos processos de domesticação que elas subscrevem; 3) a maneira como essas soluções contribuíram para reforçar ou, excepcionalmente, subverter as expectativas do público anglo-canadense; 4) a presença, inevitável, de marcadores de re-enunciação que, inscritos em certas escolhas lexicais, dependem da subjetividade do tradutor e, consequentemente, do conflito das enunciações subjacentes a toda reescritura. Sob essa ótica, uma atenção particular é dada às duas traduções (1964; 1984) do romance Le Cassé de Jacques Renaud (1964), procurando levantar questões mais gerais sobre a não tradução, a retradução, a equivalência e a criatividade tradutórias, questões reveladoras da maneira como o Canadá inglês conhecia, desconhecia ou ignorava não apenas a sociedade e a cultura quebequenses da época, mas as zonas de contato linguísticas inerentes a sua própria língua. Sendo assim, constata-se certa evolução das práticas tradutórias do joual na direção da construção de imagens voluntariamente “intranquilas” tanto da Revolução dita tranquila quanto da identidade quebequense contemporânea.
Résumé
Cet article a pour objectif d’analyser les enjeux soulevés par les principales stratégies traductionnelles qui ont été mobilisées entre 1964 et 1984 pour traduire les représentations romanesques du joual – à savoir le sociolecte, fortement anglicisé et linguistiquement appauvri, parlé par les classes populaires de Montréal – pour un lectorat anglo-canadien inquiet par la montée du mouvement indépendantiste au Québec et l’arrivée au pouvoir, en 1976, du Parti Québécois. Après avoir rappelé les caractéristiques sociolinguistiques du joual, ainsi que le double usage politique et littéraire qu’en ont fait certains écrivains à partir de 1960, il s’agit d’identifier les problèmes d’ordre lexical qu’il a posés aux traducteurs et les diverses solutions que ces derniers ont préconisées. Cela permet de mettre au jour 1) les images du soi et de l’autre que ces solutions véhiculent; 2) la nature des processus de domestication que celles-ci cautionnent; 3) la manière dont ces solutions ont contribué à renforcer ou, exceptionnellement, à subvertir les attentes du public anglo-canadien; 4) la présence, inévitable, de marqueurs de ré-énonciation qui, inscrits dans certains choix lexicaux, relèvent de la subjectivité du traducteur et, partant, du conflit des énonciations sous-jacent à toute réécriture. Dans cette optique, une attention particulière est accordée aux deux traductions (1964; 1984) du roman Le Cassé de Jacques Renaud (1964), en vue de soulever des questions plus générales portant sur la non traduction, la retraduction, l’équivalence et la créativité traductionnelles, questions à leur tour révélatrices de la manière dont le Canada anglais connaissait, méconnaissait ou ne connaissant pas non seulement la société et culture québécoises de l’époque, mais les zones de contact linguistiques inhérentes à sa propre langue. Ce faisant, on constate une certaine évolution des pratiques traductives du joual vers la construction d’images volontairement “intranquilles” tant de la Révolution dite tranquille que de l’identité québécoise contemporaine.
Mots clés: traduction de sociolectes, retraduction, images de l’altérité
Referências
BOUCHARD, Chantal. (2002). La langue et le nombril. Une historie sociolinguistique du Québec. Montreal: Fides.
GAUVIN, Lise. (1974). Littérature et langue parlée au Québec. Études françaises, nº 101, pp.
-119.
_____. (1975). Parti pris littéraire, Montreal: Presses de l’Université de Montréal.
_____. (1976). Problématique de la langue d’écriture au Québec de 1960 à 1975. Langue française, nº 31, pp.75-90.
_____. (2000). Langagement. Montreal: Boréal.
GERVAIS, André. (2000). Emblématiques de l’ “époque du joual”. Jacques Renaud, Gérald Godin, Michel Tremblay, Yvon Deschamps. Montreal: Lanctôt.
HOMEL, David. (1985). The Way They Talk in Broke City. Translation Review, nº 18, pp.
-24.
LADOUCEUR, Louise. (2005). Making the Scene. La traduction du théâtre d’une langue officielle à l’autre au Canada. Ste-Foy-Quebec: Nota bene.
LANE-MERCIER, Gillian. (2010). Untranslatability, Non-Translation, Retranslation, Creativity: A Case Study. In: Kemble, Ian (ed.), The Changing Face of Translation.
Proceedings of the 9th Portsmouth Translation Conference, University of Portsmouth, pp. 28-39.
_____. (no prelo). 1984: Disquieting Equivalents. David Homel Retranslates Le cassé by Quiet Revolution Novelist Jacques Renaud. In: Von Flotow, Luise et al. (orgs.) Translation Effects: shaping contemporary canadian culture. Ottawa: Presses de l’Université d’Ottawa.
MAJOR, André. (1974). L’épouvantail. Montreal: Éditions du jour.
_____. (1977). The Scarecrows of Saint-Emmanuel. Tradução de Sheila Fischman. Toronto: McLelland and Stewart.
MAJOR, Robert. (1977). Le joual comme langue littéraire. Canadian Literature, nº 75, pp.
-51 MEZEI, Kathy. (1955). Speaking White: Literary Translation as a Vehicule of Assimilation in Québec. In: Simon, Sherry (org.) Culture in Transit. Montreal: Véhicule Press, pp.
-148.
_____. (1998). Bilingualism and Translation in/of Michèle Lalonde’s Speak White. Translator, v. 4, nº 2, pp. 229-247.
RENAUD, Jacques. (1964). Le cassé. Montreal: Éditions parti pris.
_____. (1964). Flat Broke and Beat. Tradução de Gerald Robitaille. Montreal: Éditions du bélier.
_____. (1984). Broke City. Tradução de David Homel. Montreal: Guernica Editions
O periódico Trabalhos em Linguística Aplicada utiliza a licença do Creative Commons (CC), preservando assim, a integridade dos artigos em ambiente de acesso aberto, em que:
- A publicação se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores;
- Os originais não serão devolvidos aos autores;
- Os autores mantêm os direitos totais sobre seus trabalhos publicados na Trabalhos de Linguística Aplicada, ficando sua reimpressão total ou parcial, depósito ou republicação sujeita à indicação de primeira publicação na revista, por meio da licença CC-BY;
- Deve ser consignada a fonte de publicação original;
- As opiniões emitidas pelos autores dos artigos são de sua exclusiva responsabilidade.