Resumo
Este artigo debate a relação entre jornalismo, populismo e mídias digitais. Deste modo, observamos de que maneira os textos jornalísticos, ao produzirem narrativas acerca das manifestações sociopolíticas conhecidas como “cacerolazo”, em 2012/2013 na Argentina, durante o governo de Cristina Kirchner, e “panelaço”, em 2015 no Brasil, durante o governo de Dilma Rousseff, reforçam o processo de propagação de elementos discursivos que se imiscuem à lógica do populismo e se imbricam às dicções populistas do contemporâneo, que vêm sendo denominadas como populismo algorítmico e/ou populismo digital. Ao promoverem a circulação de certos dizeres (e não outros), partindo do efeito discursivo de evidência, como se fossem apenas “relatos de fatos”, baseados na ilusão de neutralidade e imparcialidade, as construções jornalísticas produzem uma determinação dos sentidos, filiando-se a dadas práticas discursivas, sócio-historicamente marcadas. A atividade jornalística, ao se apropriar do discurso populista, contribui para a instalação no cenário político de polaridades e dicotomias que resultaram, no contexto argentino, na derrocada do kirchnerismo em 2015 e, no contexto brasileiro, no impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 2016. A fim de ilustrarmos nossa discussão, analisaremos, a partir da perspectiva teórico-metodológica da Análise do Discurso, algumas manchetes, trechos de reportagens e fotografias, disponibilizados nos sites dos jornais argentinos Clarín e La Nación e nos jornais brasileiros Folha de S. Paulo e O Globo, na época dos eventos mencionados.
Referências
BETENCOURT, P. R. (2014). Memórias dos cacerolazos: cartografia de forças não sonoras se tornando sonoras. Dissertação de Mestrado. Pós-Graduação em Mudança Social e Participação Política da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.
CASTRO, E. (2016). Vocabulário de Foucault: um percurso pelos seus temas, conceitos e autores. Belo Horizonte: Autêntica Editora.
CELADA, M. T.; PAYER, M. (2016). O. Sobre sujeitos, língua(s), ensino. Notas para uma agenda. In: CELADA, M. T.; PAYER, M. O. (Org.). Subjetivação e processos de identificação. Sujeitos e línguas em práticas discursivas – inflexões no ensino. Campinas, SP: Pontes Editores.
CESARINO, L. (2018). On Digital Populism in Brazil. PoLAR: Political and Legal Anthropology Review. Disponível em: <https://polarjournal.org/2019/04/15/on-jair-bolsonaros-digital-populism/>.
CESARINO, L. (2019). Entrevista à Revista Eletrônica de Jornalismo Científico. Disponível em:
COLOMBO, L. A.; MARTELLI, C. G. G. (2015). O panelaço em perspectiva comparada: análise do fenômeno no Brasil e na Argentina. In: Anais do 39º Encontro Anual da ANPOCS, Caxambu/MG.
COURTINE, J.-J. (2016). Definição de orientações teóricas e construção de procedimentos em Análise do Discurso. Policromias: Revista de Estudos do Discurso, Imagem e Som, Museu Nacional, UFRJ, n. 2, v. 1, p.14-35.
DELA-SILVA, S. (2012). Discurso, mídia e educação: da (não) obviedade de sentidos. In: MARIANI, B; MEDEIROS, V. (Org.). Discurso e...: ideologia, inconsciente, memória, desejo, movimentos sociais, cinismo, corpo, witz, rede eletrônica, língua materna, poesia, cultura, mídia, educação, tempo, (homo)sexualidade. Rio de Janeiro: 7Letras/ Faperj, p.179-198.
DELA-SILVA, S.; SANTOS, R. G. (2018). A mídia e os dizeres sobre o professor: uma análise do discurso jornalístico. Cadernos de Letras da UFF, Niterói, v.57, p. 299-317.
FANJUL, A. P.; GONZÁLEZ, N. M. (Org.) (2014). Espanhol e português brasileiro: estudos comparados. 1ª ed. São Paulo: Parábola Editorial.
FOUCAULT, M. (1969). A arqueologia do saber. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014.
GOHN, M.G. (2016). Manifestações de protesto nas ruas no Brasil a partir de Junho de 2013: novíssimos sujeitos em cena. Diálogo Educacional, PUCPR, Curitiba, v. 16, n.47, p.125-146.
GOLD, T. (2015). Cacerolazos y legitimidad política en la Argentina reciente. Del “13-S” al “8-A”. In: ANNUNZIATA, R. (Org.). Pensar las elecciones: democracia, líderes y ciudadanos. Buenos Aires: Departamento de Publicaciones de la Facultad de Derecho y Ciencias Sociales de la Universidad de Buenos Aires.
LACLAU, E. (2005). A razão populista. São Paulo: Três Estrelas, 2013.
LAPOLLA CANTONI, S. (2016). Participação política não eleitoral na Argentina e no Brasil: (O que) mudou nas últimas décadas? Dissertação de mestrado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo.
MALY, I. (2018). Populism as a mediatized communicative relation: The birth of algorithmic populism. Tilburg Papers in Culture Studies, n° 213. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/328095323_Populism_as_a_mediatized_communicative_relation_The_birth_of_algorithmic_populism>.
MALY, I. (2019). Algorithmic populism and algorithmic activism. Diggit Magazine. Disponível em: <https://www.diggitmagazine.com/articles/algorithmic-populism-activism>.
MARIANI, B. (1996). O comunismo imaginário: práticas discursivas da imprensa sobre o PCB (1922-1989). Tese de Doutorado. Pós-Graduação em Linguística. Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), São Paulo.
MARIANI, B. (1993). Os primórdios da imprensa no Brasil (Ou: de como o discurso jornalístico vai produzindo memória). In: ORLANDI, E. P. (Org.). Discurso fundador: a formação do país e a construção da identidade nacional. 2ª ed. Campinas: Pontes, 2001.
MARIANI, B. (2016). O político, o institucional e o pedagógico: quanto vale a língua que ensinamos? Matraga, n. 38, v. 23, Rio de Janeiro: jan/jun, p.43-63.
NEGRI, A. (2014). Entrevista ao Caderno PoA. Disponível em: <http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2014/06/ antonio-negri-e-a-multidao-que-comanda-a-historia-4520222.html>.
SERRANI, S. (2010). Discurso e cultura na aula de língua. Campinas: Pontes.
Fontes jornalísticas consultadas:
“Seguridad, libertad y justicia”, los principales reclamos de la gente (Clarín, 14/09/2012) <https://drive.google.com/file/d/15iBEuDNJGuOCqjACLWhMkXD_f0fPDyow/view?usp=sharing>
Marchas, reclamos y acciones activan la participación social (Clarín, 02/06/2013) <https://drive.google.com/file/d/1igviQJ8AfRtDZ68sa3PyeDg22Wh50Drd/view?usp=sharing>
Cacerolazo 18A: multitudinarias protestas contra el Gobierno en todo el país (La Nación, 18/04/2013) <https://drive.google.com/file/d/1kkBK8nmuNSobhQ27ZpDIfZTutIw-E-bR/view>
Macri y el 18A: “Estoy del lado correcto” (La Nación, 19/04/2013) <https://drive.google.com/file/d/19LQjelCb8I2i7HJFMO_ZMMPb3aikeFcO/view?usp=sharing>
Para el kirchnerismo “hubo menos gente” (La Nación, 19/04/2013) <https://drive.google.com/file/d/12Ss3ficgxEI22S5Yuoalkk5bdGwF60ki/view?usp=sharing>
Cristina Kirchner criticó la protesta del 18A contra la reforma judicial (La Nación, 27/04/2013) <https://drive.google.com/file/d/1JDjk2k_3tppdbPVQ9jaJQQHxC0-12mZI/view?usp=sharing>
Indignação com a corrupção foi motivação para maioria nas ruas (Folha de S. Paulo, 15/03/2015) <https://drive.google.com/file/d/1batimH0fiXAsBnwwHABsTMzuK-48pjMe/view?usp=sharing>
Protestos de 15 de março (Folha de S. Paulo) <https://drive.google.com/file/d/1yDEPZokU0lWUzKUwh3Q1VP-8borNB8Zz/view>
Adesão menor em protestos deixa Planalto aliviado (Folha de S. Paulo, 12/04/2015) <https://drive.google.com/file/d/1mZK1kukVD4vNNMyNSFxGCMTyxj5A-G2s/view>
Eduardo e Jair Bolsonaro fazem “selfies” e distribuem abraços em SP (Folha de S. Paulo, 12/04/2015) <https://drive.google.com/file/d/1UYcjOlskEYgYaGx9dtXuIhp6dmaCEGlF/view?usp=sharing>
Manifestantes também atacam a oposição em ato contra governo em SP (Folha de S. Paulo, 12/04/2015) <https://drive.google.com/file/d/15AVKv7fKUVgFGEcgD3ktK1ca6IA_yVG2/view?usp=sharing>
Irritação com corrupção foi motivação para maioria (Folha de S. Paulo, 13/04/2015) <https://drive.google.com/file/d/1sSB2hfrkmRpC84-Y2jO5g8KWgMe3wSKj/view?usp=sharing>
Aécio diz que PT tenta 'tapar o sol com a peneira' ao acusar oposição de responsabilidades pelos protestos (O Globo, 09/03/2015) <https://drive.google.com/file/d/1mEOOTEDvBuyLjOmibMPxU7RTxQG_XeOM/view?usp=sharing>
PT diz que panelaço fracassou e foi 'financiado' por partidos de oposição (O Globo, 09/03/2015) <https://drive.google.com/file/d/1I9oGTqEX-SOEBGAaQDRBqviS0dTf33I7/view?usp=sharing>
O periódico Trabalhos em Linguística Aplicada utiliza a licença do Creative Commons (CC), preservando assim, a integridade dos artigos em ambiente de acesso aberto, em que:
- A publicação se reserva o direito de efetuar, nos originais, alterações de ordem normativa, ortográfica e gramatical, com vistas a manter o padrão culto da língua, respeitando, porém, o estilo dos autores;
- Os originais não serão devolvidos aos autores;
- Os autores mantêm os direitos totais sobre seus trabalhos publicados na Trabalhos de Linguística Aplicada, ficando sua reimpressão total ou parcial, depósito ou republicação sujeita à indicação de primeira publicação na revista, por meio da licença CC-BY;
- Deve ser consignada a fonte de publicação original;
- As opiniões emitidas pelos autores dos artigos são de sua exclusiva responsabilidade.