Resumo
Entre as décadas de 1940 e 1960, os artistas Dimitri Ismailovitch e Maria Margarida Soutello, ambos de origem europeia e imigrados ao Brasil, produziram juntos uma série de obras representando figuras negras e versando sobre temáticas ligadas à afro-brasilidade. O presente artigo examina essa produção e discute sua primeira recepção, com o objetivo de tentar compreender sua inserção no contexto cultural da época. Longe de entender essas obras como mera apropriação cultural, aprofunda-se a análise daquilo que será chamado aqui de ‘imaginação diaspórica’. Argumenta-se que a condição de deslocamento e dupla consciência dos artistas, característica do exílio, canalizou seu olhar sobre a negritude para um esforço de reinvenção identitária por meio da mascarada e do misticismo. O aspecto carnavalesco da cultura brasileira permitiu que essa construção imaginária prosperasse, se constituindo em realidade social.
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